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sexta-feira, 24 de agosto de 2012

Crônicas - Romildo Labigalini


O SOGRO DO CHICÃO

                                               Romildo Labigalini

       Eu estava na cidade de Itapira quando meu carro teve um problema mecânico. Procurei um bom mecânico e me indicaram o Chicão.
       Enquanto seu funcionário consertava o defeito, Chicão convidou-me a tomar um cafezinho na cozinha que ficava nos fundos da oficina.
       Sentados num banquinho ele começou a contar sobre seu sogro, que morava com ele. Achei engraçado o modo com que ele falava, dizendo que tinha feito a “viagem do corvo”.
       Foi assim:
       Seu sogro, com mais de 80 anos, morava na zona rural e tinha ficado viúvo. A esposa do Chicão, filha única, ficou preocupada por seu pai morar sozinho e pediu permissão ao marido para que o pai viesse a morar com eles. Chicão não teve como negar. No dia seguinte o sogro já estava acomodado num quarto todo seu, feliz da vida.
Chicão tinha uma netinha de 4 anos, que sempre vinha passar alguns dias na sua casa. Aí começou o “furdúncio”. Todas as manhãs o sogro assistia a missa na Rede Vida e a netinha queria assistir desenho. O forrobodó estava formado, era só encrenca entre os dois. Para contornar esse atrito, Chicão instalou uma TV pequena no quarto do sogro. Este assistiu somente uma vez a missa e disse que não gostou porque a TV era muito pequena e gostava mais daquela da sala que era maior.
Na hora da missa, ele aumentava tanto o volume da TV que toda a vizinhança também ouvia.
O sogro, que tinha os cabelos branquinhos resolveu pintá-los de preto, para aparentar menos idade e talvez arranjar uma namorada.
Comprou um tubo de tinta e foi até ao barbeiro. Voltou para a casa com os cabelos, testa e orelhas todos pretos. Durante a semana inteira pegava um paninho molhado e ia tirando as manchas. Lavar a cabeça , nem pensar. Tinha receio de contrair gripe ou pneumonia.
Não sei se ele assistiu na TV alguma campanha para economizar água. O sabonete já faz 2 meses que não foi usado está seco, rachado. O creme dental ainda está na caixinha, intacto. Ele não gosta de água nem para beber e quando está com sede toma refrigerante.
Detesta o vento e nunca abre a janela do seu quarto, pois a cama ficará fria. No verão dorme com um cobertor de lá. Por falar em dormir, ele deita ás cinco da tarde e levanta ás cinco da manhã, dorme 12 horas. Pode estar chovendo ou caindo geada, este é o horário dele. Depois que ele se levanta ninguém mais dorme. É o barulho da caneca esquentando o leite, o arrastar da cadeira prá lá e prá cá, leva o saco de lixo para fora, bate o portão, uma “delicia”.
Na hora do almoço é outra “tortura”. O sogro mastiga rápido, com a boca aberta e o atrito do casal de dentaduras  batendo uma na outra é insuportável. Parece o dedilhar de castanholas nas mãos de uma dançarina espanhola.
Dia desses Chicão levou para casa uma revista de moda e tinha algumas fotos de moças com biquíni. O sogro quando viu as moças quase peladas, arregalou os olhos, colocou a revista debaixo do suvaco, foi para seu quarto e fechou a porta. Sei não ......





***



Geralmente nas pequenas cidades do interior, muitas pessoas são conhecidas pelos apelidos. Também a mesma coisa acontece aqui em Monte Sião. Em 2002 fiz uma brincadeira com essas pessoas. É assim :


                                         PAGODE DOS APELIDOS
       
                                                                       Romildo Labegalini

            Obs.: - As palavras MAIÚSCULAS são os apelidos.



Em nossa cidade tem muitos apelidos
Então , para brincar com eles vamos cantar:
COEIO, todo BREJEIRO, furou a ZOREIA
Já pensa que é GALÃ e quer paquerar.

Um GATO cheio de PURGA entrou no PAIÓ
RATINHO, que é SABIDÃO, entrou no BURACO.
XAROPE, o Zé TOSSINHA toma na CUIA
O ÍNDIO quer ser TARZAN e caçou o MACACO.

CALANGO armou um BARRACO com a LAGARTIXA
Porque mostrava a BUNDINHA pro JACARÉ
Lá fora o ZÉ-DA-NOITE , feito CORUJA
Coçava o seu PEZÃO cheio de CHULÉ.

Francisco é um ateu e o DITO, DA FÉ
Não sei se o DITO SANTO já vez milagre.
Na arma, uso CHUMBINHO e o ZÉ, PORVA
MOSQUITO gosta de doce e não de vinagre.

O Pedro é tão tranqüilo e o ZÉ, NERVOSO
BAIANO é tão gentil e o Mauro, CHATO
No sítio crio JUMENTO e o ZÉ, BURRO
Garanto, no PÉ-DE-PORCO não vai sapato

A  CHITA, macaca esperta, come BANANA
Não gosto de PACUERA, até renego.
No pavio da LAMPARINA só sai FUMAÇA
João usa PARAFUSO e o ZÉ, PREGO.

Um  VÉIO  BOIZÃO com BERNE não dá CHURRASCO
Prefiro PATÃO assado e o ZÉ, GALINHA
No céu da BOCA do PADRE não tem a LUA
Cerveja, só tomo Skol e o ZÉ, BRAHMINHA.

Eu gosto de CASAGRANDE  e o ZÉ, DO RANCHO
Também gosto de MOELA e um FRANGÃO,
QUAIADA, um QUEIJO fresco e MORTADELA
Um prato de BACAIAU e também LEITÃO.

CASINHA que tem GOTEIRA mora o XUXA
Amarra lenço de SEDA no CABELINHO
No BELO carro também tem um TOCA-FITA
Dirige, em MARCHA-LENTA o seu DOGINHO.

BODÃO, quando vê CABRITA, fica BABÃO
BODINHO, seu FIO novo, mama o LEITINHO.
Nem talco, nem sabonete tira o FEDÔ
De tanto encher a PANÇA soltou um BAFINHO.

Num grande pé de MANGUEIRA estava o SANHAÇO,
CODORNA, de CARÇÃO BRANCO e um TICO-TIQUINHO,
CANÁRIO, um PERIQUITO e o TIZIU,
Cantavam todos felizes, junto ao PARDINHO.

No lago estava o MARRECO, GANSO e o PATINHO,
BAGRINHO, SORRISO largo e seu FIÃO,
LEBRINHA, PELINHO liso, pegou a PÀ
Jogava todo o LIXINHO em um LATÃO.

O GRILO, na minha horta é um CASTIGO
Comeu toda a CEBOLINHA e o JILÓ
Ficou só o TOMATINHO, todo VERMEIO
BOQUINHA virou um CISCO, não é COIÓ.

Eu gosto de MEXERICA e o LAZO, GOIABA
Também gosto de um suco de SIRIGUELA.
GARRUCHA, no cinturão, leva o QUATI
Montado em seu MULÃO, pois a vida é BELA.

TATÚ luta KARATÊ e ganhou um CANECO
Pegou o tubo de COLA e tirou a TAMPINHA.
Pegou a sua CUECA e pôs no CABIDE
Comeu doce de CANUDO lá na cozinha.

MORCEGO, COBRA e LAGARTO estão na CAVERNA.
A VACA com seu BOCÃO só come CAPIM.
SAPINHO não tem GORDURA, é um PALITO
Não é artista da Globo, mas faz PLIM-PLIM. 





***




SÁBADO NA CHÁCARA         
             
                                                          Romildo Labigalini

Já faz mais de um mês que minha mulherzinha Nilza vem buzinando na minha orelha pra que eu coloque uma irrigação na nossa chácara para irrigar a grama e as flores que ela planta, principalmente as rosas de todas as cores. Ela disse que estava cansada de irrigar no regador. Eu falei “mulherzinha” porque ela é pequenininha, baixinha e mede só 1,49m de altura. Como ela é 25 anos mais nova do que eu, e com receio de apanhar dela, criei coragem e fui até a agropecuária do Eduardo e comprei todos os apetrechos que precisava : uma bomba-sapo, para colocar dentro da caixa d’água, 10 aspersores, canos e registros.
            Chegou sábado e como a imobiliária fica fechada nesse dia, pegamos nossas tralhas e fomos para lá. Para trabalhar na chácara, uso roupas velhas, até fiz um pequeno rasgo no joelho e outro na bunda da minha calça pra que todos pensem que eu trabalho mesmo. Sentei até num barranco para que minha bunda ficasse suja de terra. Coloquei meu chapéu de palha pra ficar idêntico a um verdadeiro trabalhador e fui fazer um levantamento topográfico do local onde seria montada a irrigação. Peguei um barbante, medi aqui, lá, finquei umas estaquinhas onde seriam colocados os aspersores e comecei o serviço.
            Minha baixinha já tinha ido cuidar do seu jardim. Depois de uma hora ficou tudo pronto para o inauguramento da obra e gritei prá Nilza que saisse correndo que eu ia ligar a bomba. E liguei ! Foi uma aguaceira, uma espatifeira de água que deu até gosto, parecia uma fonte luminosa. Eu fiquei olhando os pinos dos aspersores que giravam muito rápidos e fiquei tonto, mais tonto do que já sou. A Nilza ficou tão contente que começou a pular feito uma macaquinha, jogava o chapéu para cima e gritava, fazendo um banzé, um alarido: “Até que enfim, viva, aleluia”. Depois veio correndo até onde eu estava, me abraçou e lascou um beijo tão forte na minha boca, que quase perdi o folego.
            Depois desse trabalho tão pesado que acabei de executar, fui sentar-me numa pedra pra descansar um pouco. A Nilza continuou na sua labuta. Na hora do almoço ela foi pra cozinha preparar nossa comida. Ela cozinha tão bem que de longe já senti o cheiro gostoso do tempero dela. Quando a comida ficou pronta ela foi até a porta da cozinha e gritou: ”Ô surdinho, vem almoçar”. Eu não ouvi direito o que ela falou, mas o modo que balançou o braço achei que era prá ir almoçar.
            Enchemos nossos pratos, peguei uma moringa d’água, duas canecas de alumínio e fomos sentar num toco embaixo da árvore. Depois de encher a pança, fui tirar um cochilo de apenas 150 minutos. Levantei bem descansado, fui até ao rancho e peguei uma cavadeira pra fazer alguns buracos e fincar os mourões para um estaleiro de maracujá. Dei cinco cavadeiradas, o solo estava muito duro e já fiquei cansado, com a língua de fora. Chamei minha baixinha e pedi que ela continuasse o trabalho e rapidinho os buracos estavam prontos. Coloquei os mourões e falei para ela socar bastante para que eles ficassem firmes e fiquei ao seu lado, em pé, fiscalizando se o serviço estava ficando bem feito. Depois ela me ajudou a trançar os arames do estaleiro, para que as ramas do maracujá se espalhassem bem.
            Ela plantou 10 pés dessa fruta e disse que é pra fazer bastante suco pra mim, e disse também que sou muito agitado, apressado e que durmo pouco, somente 10 horas à noite e mais um tanto de dia. Quando escureceu voltamos prá casa. Depois do banho fui caminhando perrengue, com dor na cacunda e me espatifei no sofá. Lá da cozinha vem um barulhinho. É ela que está colocando gelo num copo e preparando um drinque pra mim. Traz o copo com a bebida, coloca-o na mesinha, senta-se ao meu lado e começa a passar suas mãozinhas em meu rosto. Não sei se é carinho ou se ela está tentando eliminar minhas rugas, fazendo massagem. Depois passa seus dedinhos nos meus poucos cabelos, já grisalhos e eu fecho os olhos de tanta gostosura. Encosto minha cabeça no seu peito e escuto seu coraçãozinho bater forte: TUMTUM, TUMTUM, TUMTUM ...  Sua bateria está bastante carregada.
            Agarro ela pela cintura e fico encolhido igual uma criança querendo colo. O meu coração está batendo fraquinho: tum... tum... tum...
            Acho que minha bateria está pifando.     Boa Noite !






***






Remexendo na gaveta da minha escrivaninha encontrei esse texto escrito em novembro de 2002 e que não foi publicado. O titulo é:


COISAS DE FAMÍLIA
                                             
                                                    Romildo Labigalini


         Meu filho Marcelo é o caçula dos outros três. Alto, moreno, musculoso, cabelos negros, é um moço bonito e não se parece com o pai. Sua vocação é Agronomia e está fazendo Cursinho no Colégio Objetivo para tentar passar no vestibular.

         Enquanto isso não acontece, gosta de passar as horas disponíveis no nosso sítio, em contato com a natureza. Embora eu tenha meeiro na cafeicultura, Marcelo vai lá, pega na enxada, ajuda na capina sem ganhar nada, apenas por gostar da lida. Conserta cercas, cuida do gado e faz o que mais gosta: cavalgar.

         Ele é tão caprichoso com nosso cavalo negro raça “bretão”, que o trata com o maior carinho: dá banho com shampoo, passa a raspadeira para deixá-lo com o pêlo liso e brilhante, ferra e tosa o animal. Para deixá-lo ainda mais bonito, faz tranças em sua crina e cauda. Fica uma belezura e dá a impressão que Marcelo vai levá-lo para alguma exposição ou desfile de cavaleiros. É somente para levá-lo a passear pela cidade, logicamente levando o cavaleiro no lombo.

         Este ano Marcelo cavalgou até Aparecida do Norte para receber as bênçãos e agradecer a Nossa Senhora Aparecida. Foram 5 dias de viagem, mas valeu a pena e voltou feliz da vida por ter feito uma viagem tão especial.

         Quando Marcelo tinha 9 anos dei a ele um presente que o marcou muito: um grande cavalo baio. Sua felicidade era tanta que ficava sorrindo o dia todo. Em seu quarto há uma foto dessa época, ele, todo garboso trajado de peão, montado nesse animal.

         Meu neto Giovanninho, tem a mesma vocação do tio por cavalos e tem uma foto sua, também com 9 anos montado num cavalo e a aparência de ambos são idênticas. Atualmente Giovanninho tem 11 anos, gosta de vestir-se como peão, já está fazendo sucesso com as meninas e adora cavalgar.

         Voltando ao assunto do meu filho Marcelo, ele adora conversar com pessoas idosas e diz que aprende muito com elas. Quando ele chega do Objetivo para almoçarmos juntos, me abraça, me beija e pede a bênção. Ele já está abençoado para sempre, é um bom menino. Atualmente é muito raro uma filho agir dessa forma e sou muito feliz, pois todos os meus filhos fazem isso. Para completar minha alegria todos os meus sobrinhos também fazem o mesmo. Quando nos encontramos na rua ou em festas, eles não se envergonham em me abraçar e beijar. Não é só comigo mas sim, com todos os tios. Nossa união é sempre regada com muito amor.





P.S.

         Em 2003 Marcelo prestou vestibular na Faculdade de Agronomia em Machado-MG e foi aprovado. Além das aulas teóricas participou também de aulas praticas no campo, como cuidar do café orgânico, preservação do meio ambiente, proteção às matas, mananciais, fauna e flora.

         Em junho de 2007 ele se formou e recebeu o diploma de Engenheiro Agrônomo e eu fui na sua formatura. À tarde fomos até uma mercearia onde ele era cliente e comprava fiado. Lá tinha alguns amigos dele cantando. Marcelo pediu o violão e nós dois cantamos juntos algumas músicas sertanejas e foi muito gostoso.

         À noite foi a cerimonia de formatura. Ele, para variar, na hora em que foi chamado para receber o canudo, colocou na cabeça um chapéu preto de peão e foi muito aplaudido.

         Embora não sendo casado, tem um filho lindo chamado Pietro Monteiro Labigalini, fruto de um namoro com Caroline Monteiro, filha do meu grande amigo Eraldo Monteiro e de sua esposa Sueli, residentes em Morungaba-SP. Embora o casamento não se concretizou, a amizade entre todos nós permanece.

         Marcelo gosta de morar sozinho e está residindo em sua chácara no bairro Virtuosa, aqui em Monte Sião. Sempre reúne seus amigos cantadores para fazer um sarau de músicas sertanejas, principalmente as de raiz.

         Ele dá assistência técnica a diversas fazendas da região e é representante dos adubos “Heringer”. Diz que vai construir nessa chácara “uma casinha branca de varanda, um quintal e uma janela para ver o sol nascer”.

                                                                       Setembro 2012



***



TUDO DEPENDE DE MIM 

   Hoje levantei cedo pensando no que tenho a fazer antes que o relógio
marque meia-noite.
   É minha função escolher que tipo de dia vou ter hoje.
   Posso reclamar porque está chovendo... ou agradecer às águas por
lavarem a poluição.
   Posso ficar triste por não ter dinheiro... ou me sentir encorajado para administrar minhas finanças, evitando o desperdício.
   Posso reclamar sobre mim

minha saúde... ou dar graças por estar vivo.
   Posso me queixar dos meus pais por não terem me dado tudo o que eu queria.... ou posso ser grato por ter nascido.
   Posso reclamar por ter que ir trabalhar.... ou agradecer por ter trabalho.
   Posso sentir tédio com as tarefas da casa... ou agradecer a Deus por ter um teto para morar.
   Posso lamentar decepções com amigos... ou me entusiasmar com a possibilidade de fazer novas amizades.
   Se as coisas não saíram como planejei, posso ficar feliz por ter hoje para recomeçar. O dia está na minha frente esperando para ser o que eu quiser.
   E aqui estou eu, o escultor que pode dar forma.
   "Tudo depende só de mim."

                                                              Charles Chaplin.





***






DAVID E GOLIAS

                                       Romildo Labigalini

         Se você, caro leitor, está pensando que o assunto é sobre Bíblia, enganou-se. Como diz meu amigo Cidão, este é um fato “real, verídico e verdadeiro”. Tenho um amigo residente em São Paulo, chamado David. Pessoa culta, bom papo, discorre sobre qualquer assunto. Outrora foi ótimo mecânico de carros de corrida e boêmio das noites cariocas e paulistanas. Hoje, já casado, aposentou-se da boemia e sua companhia é muito agradável quando sóbrio, mas como diz um velho ditado “algum defeito todo mundo tem”, ele também não é perfeito. Nem eu.       Quando toma uns ‘mé’ fala até pelos cotovelos.
Certa noite estava o baixinho e franzino David em companhia de alguns amigos no bar do Zé Padeiro, aqui em Monte Sião. A conversa estava animada, quer dizer, só ele falando. Nisso adentrou no bar um nordestino grandão, forte, chapéu de couro e sandálias idem, um bigodão deste tamanho e perguntou aos presentes:
- Que bicho deu hoje  no jogo do bicho?
David, zombeteiro, intrometido e xereta respondeu:
-Deu morcego no primeiro prêmio e lagartixa no segundo.
O homem arregalou os olhos, puxou as pontas do bigode e disse:
- Óxente! Olhe menino, cabra da peste, num tem morcego nem lagartixa no jogo do bicho. Tu tá mangando d’eu. Vô furá teu bucho e te castrá! E ameaçou tirar a peixeira da cinta. Os amigos da “vitima” foram se retirando do bar, temendo o forrobodó dos diabos. Apenas o Cidão ficou. Não que ele fosse tão corajoso, mas porque estava tomando uma cervejinha gelada em pé, encostado na parede, com o cotovelo apoiado sobre o balcão nos fundos do bar. Bem que ele queria correr, mas sua volumosa barriga e os dois briguentos na sua frente o impedia. Estava encurralado. David olhou para cima, viu a cara feia do gigante, ficou pálido e tremeu. Sentiu uma água quente descendo pelas pernas e percebeu que tinha urinado nas calças. Mesmo neste estado de calamidade, sem poder correr, resolveu “peitar” o homem, colocando suas mãos no largo peito dele. Ainda teve presença de espírito: sabia que os nordestinos gostam de literatura de cordel e resolveu improvisar o seguinte repente:
         “Prô senhor que não me conhece,
         Sou um cabra bem brejeiro.
         O meu nome é David,
         Minha mãe teve três filhos,
         Todos eles interesseiros:
         Um deu prá tocar viola,
         Outro prá tocar pandeiro.
         Eu dei prá transá com ‘muié’ bonita
         Que é um ‘selviço’ mais maneiro”.
O nordestino, recordando da sua distante terra natal, ficou maravilhado com os versos. Bateu palmas aplaudindo e disse:
-Minino, gostei do repente. Ocê é porreta mesmo. Vamo tomá uma pingaiada que eu pago tudo!



***




HOUVE UMA VEZ UM POETA

                                             Márcio R. Labigalini
Houve um tempo
em que minha mão voava pelo papel
com a liberdade de quem não tinha culpa...
de quem não sabia que o tempo corria.

Fora isso,
a mão tudo expressava,
tudo entendia, tudo sabia,
tudo queria e tudo pensava.

Hoje a mão só calcula,
mal cumprimenta, mal acaricia.

Naquele tempo, medo não havia,
qualquer palavra era poesia,
qualquer lugar, moradia
e qualquer amor, taquicardia...

E quanto a mão amou,
quantos carinhos a mão trocou
e por quantos amores
também ela chorou ...

Hoje,
a mão nada sente,
nada expressa, nada entende,
nada pensa, nada diz.

Porém, por incrível que pareça,
a mão ainda sonha
com o poeta que havia.




***



O BENZEDOR


                                  Romildo Labigalini



         Os meus falecidos amigos Zé Dorica e Ademar Magioli tinham muita amizade a ponto de um passar trote no outro. O Dorica beneficiava arroz num barracão situado nos fundos da residência do Silvio Cunha, próximo ao Fórum. O Ademar era motorista de ônibus e nos dias de folga passava o tempo jogando baralho e conversa fora com esse seu amigo.

         Certo dia chegou um casal numa charrete, portando o filho enfermo ao colo e disse ao Dorica que iriam até Águas de Lindóia à procura de um médico especializado em pediatria. Zé Dorica não perdeu a oportunidade de aprontar em cima de seu compadre Ademar e disse ao casal:

- Não é necessário procurar um médico. Conheço aqui em Monte Sião um benzedor que cura qualquer doença, faz até milagres.

Alertou a mãe de que o milagreiro não gostava de benzer e que seria necessário insistir muito para que ele fizesse a simpatia. Com o endereço nas mãos, o casal chegou à residência do “benzedor”. A mãe, com a criança nos braços, pediu a Ademar que fizesse o benzimento. Este, percebendo que se tratava de um trote, tentou explicar que não era benzedor e que seria melhor procurar um médico para examinar o menino. O casal continuou insistindo, dizendo que o homem da máquina de arroz garantiu que o garoto seria totalmente curado.

Mediante a insistência dos pais, a esposa de Ademar, sensibilizada com a situação do casal, pediu ao esposo que fizesse alguma coisa. Ele cedeu, dirigiu-se ao quintal, voltou com um raminho de arruda nas mãos, levou a mãe com a criança até à torneira e começou a movimentar os lábios como se estivesse fazendo uma oração e aspergia água na cabecinha da criança.

         Após a cerimonia a mãe perguntou se haveria necessidade de retorno, sendo informada que não era necessário e que apenas um benzimento bastava.

         Passado quase um mês, Ademar chega do trabalho e encontra no fundo do quintal um belo carijó preso em um caixote. Sua esposa lhe disse que foi um presente dos pais do menino benzido, e que a criança estava curada e forte como nunca, graças ao grande benzedor.

Moral da história: Quem tem fé recebe milagres!





***





ADEUS AO MEU PRIMO SERESTEIRO

                                                    Romildo Labigalini



                                                
         Faz somente três dias que não o vejo e a saudade já está açoitando meu peito. Ugo Labegalini não era apenas primo mas, sim, um irmão. Depois de ficar 60 dias internado no Hospital Vera Cruz em Campinas, onde tinha se submetido a uma cirurgia cardíaca, voltou para casa e estava se recuperando. Tinha emagrecido 20 quilos, começou a fazer fisioterapia e aparentemente melhorava a cada dia. Mas seu coração não aguentou e parou quando ele estava dormindo, sem nenhuma dor, tranquilamente.
Uma multidão o acompanhou até sua última morada, pois ele era muito estimado pela sua educação e honestidade.
         Dele só guardo boas lembranças. Convivemos por mais de quarenta anos, cantamos no coral da Igreja Matriz durante 25 anos sob sua regência. Quantas serenatas fizemos juntamente com nossos companheiros de música. Quase toda segunda-feira ele aparecia em minha casa com o violão à tiracolo. Petiscos, cervejinha, cantoria e minha esposa Nilza nos acompanhando. Quando olhávamos no relógio já era meia-noite, as horas passavam tão rápidas que nem percebíamos. Meus vizinhos nunca reclamaram, talvez estivessem gostando do repertório.
         Ugo gostava muito de cantar com seus filhos Anderson e Robson e também com sua esposa Aída. As vozes desse casal eram idênticas a Cascatinha e Inhana. Certa vez gravaram diversas músicas em fita cassete e venderam bastante em nossa cidade. Foi um sucesso. Ele foi diretor do “Jornal Monte Sião” por mais de 40 anos. Mensalmente montava esse jornal, levava até a gráfica em Itapira e ia buscá-lo no dia seguinte. Geralmente acontecia de não haver dinheiro suficiente para pagar a impressão. Então ele me “intimava” a sairmos juntos para pedir aos comerciantes locais a contribuição de dez reais. Quem muito nos ajudou foi o Toninho da Fábrica. Certa vez fomos pedir dez reais e ele quis dar cem. Dissemos que era muito, ele insistiu tanto que aceitamos somente cinquenta. Toninho nos disse que quando precisássemos novamente, era para procurá-lo. Ele sempre colaborou com o Jornal e também com quem o procurasse.
         Muitas pessoas não sabem, mas quem pagava as despesas do correio para postagem do Jornal aos assinantes de outras localidades, era a Telma, filha do Ugo. Não sei qual será o destino do “Jornal Monte Sião”. Vamos torcer para que se encontre um sucessor dele.
         Tenho certeza que está havendo grande festa no céu. Tio Batista, pai do Ugo,  já tirou sua sanfona “Stradella” da caixa. O Ugo já afinou o violão e estão executando aquelas lindas valsas que tocavam aqui para nós.




***




OBSERVATÓRIO METEOROLÓGICO

                             Romildo Labigalini-1993

         Monte Sião já tem, também, o seu Serviço de Meteorologia para informar como está o tempo. Se fosse transmitido pelo satélite seria uma previsão, mas no nosso caso é somente no momento exato, em tempo real, quando ocorre o fenômeno da natureza que se faz a leitura. Ele está localizado no Bairro Sertãozinho dos Cardosos, ou melhor, pendurado na parede da casa do meu amigo Coêio.
         O aparelho é muito eficiente e para fazer a leitura não é necessário nenhum especialista ou técnico, basta apenas saber ler, pois é muito simples: é um burrinho feito de madeira e o segredo está no rabo, feito de fiapos de corda. Chama-se “BARÔMETRO DO BURRO” e para verificar como está o tempo é só seguir as instruções abaixo:
COLOCAR AO AR LIVRE
Quando o rabo do burro estiver seco ... TEMPO BOM
Quando o rabo do burro está gelado ... FAZ FRIO
Quando o rabo do burro está mexendo ... VENTO
Quando o rabo do burro mexe muito... TEMPESTADE SE APROXIMANDO
Quando não se vê o rabo do burro ... NEBLINA
Quando o rabo do burro está molhado ... CHUVA
         Como vocês puderam observar,  esse Serviço Meteorológico é muito eficiente.



***





SAUDADE RENITENTE

                                                Romildo Labigalini/Fev. 2003

Sempre que a saudade aperta “mio cuore”, vou visitar meus estimados parentes no Paraná. Nossos encontros amenizam essa saudade ao vê-los alegres e com saúde.
         Geralmente a conversa gira em torno de nossas reminiscências, onde nascemos, no Bairro Labegalini, aqui nas Minas Gerais. Italianos gostam de recordar.
         Este ano a viagem foi muito especial, pois eu e minha esposa Nilza fomos padrinhos de casamento da Patrícia com Fernando. Esse convite nos alegrou profundamente e chegamos à conclusão de que somos muito estimados pelos noivos, seus familiares e todos os parentes.
         O enlace na Igreja de Marumbi foi lindo e emocionante. A recepção, no clube local todo enfeitado , música ao vivo, e o reencontro com parentes que há muitos  anos não víamos, foi gratificante.
         Os pais da noiva, Euclides De Nez e Janice Labegalini De Nez  e a filha Aline, são companhias muito agradáveis. Dá vontade de ficar sempre ao lado deles. O avô da noiva, Santinho Labegalini, estava bastante alegre e muito elegante no casamento. Por falar em Santinho, ele é meu tríplice parente: primo, tio e padrinho. Gosto demais do “maledetto” que me batizou. Com 85 anos, olhos azuis, parecido com o ator Anthony Quinn (do filme “Zorba, o Grego”), tem uma excelente memória.  Como todo italiano, é despachado e franco. O que ele acha correto, fala, sem rodeios. E ainda gosta de jogar truco, e muito bem. Todas as partidas que joguei contra ele e seu genro Euclides, não venci nenhuma. Ou eles são bons no baralho ou, eu, ruim.
         Hoje, viúvo, morando sozinho (sua filha Janice é quem cuida dele), o velho guerreiro sente solidão. Ele gostaria de ter ao seu lado uma companheira para ouvir seus queixumes, suas histórias e “prosear”.
         Nas tardes domingueiras, acomoda-se em sua cadeira preferida, entrelaçada com fitilhos redondos de plásticos,  na área de sua casa e assiste de “camarote” partidas de futebol, sua grande paixão, no campo do outro lado da rua.
         Embora com os olhos fixos no jogo, as névoas do seu pensamento divagam em recordações:
“Quantas e quantas partidas de futebol joguei durante a minha mocidade no Bairro Labegalini, ao lado de meus primos e tios (hoje muitos deles jogando no céu)... meus saudosos pais Vitório e Rita... os nonos Luigi e Lucia triturando milho na pedra movida a rodão d’água, transformando-o em fubá mimoso. Que delicia a polenta com radicci... os tios tocando e cantando canções de saudade da Itália.
         O grande “vinhetto” abarrotado de cachos de uvas, prontos para serem colhidas e transformadas em vinho... o cheiro doce-azedo da adega, os barris guardados pelo frescor do porão da casa do nono (casona, para nós)... os bailes na tulha, quando meus olhos travessos escolhiam a moça mais bonita para dançar, aconchegando-a para bem perto do meu corpo, sentindo aquela sensação de que estava flutuando... o casamento com minha amada esposa Páscoa , baixinha, alegre e sempre risonha, companheira em todos os momentos, no trabalho duro, nas diversões, na criação e educação dos filhos... filhos, hoje todos casados, seguem sua própria vida, trilhando seus caminhos. Que Deus os abençoe e também aos netos e bisnetos... o tempo encarregou-se em tingir de flocos de algodão os cabelos de minha querida esposa, que foi ao encontro de seus pais e também dos meus... QUANTA SAUDADE , DIO MIO! QUANTA SAUDADE !”




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UM ENGANO

Um estudante, em viagem ao estrangeiro, ao passar por uma loja de modas, entrou para comprar um presente para a sua namorada.
Escolheu um PAR DE LUVAS e pediu à balconista da sessão de pacotes para fazer o embrulho para presente. A balconista, cometendo um engano, trocou o pacote por um outro, que continha uma calcinha para senhora.
O estudante, sem tomar conhecimento do engano, enviou o presente à sua namorada, juntamente com uma carta:
“Querida, sabendo que o dia 12 de junho é o Dia dos Namorados, quis fazer-te uma surpresa, embora sabendo que o que lhe mando não usas, pois sempre que saímos juntos, nunca te vi usar. Gostaria de estar perto de você quando vesti-la. Fiquei em duvida quanto à cor, mas a moça da loja me disse que esta não desbota. É um pouco larga, mas ela me disse que é para a mão entrar melhor e os dedos se moverem à vontade. É bom que, depois de usa-la, colocar um pouco de talco e virá-la ao avesso para tirar o mau-cheiro. Quero que fiques satisfeita como eu fiquei, porque a mesma irá cobrir aquilo que um dia irei te pedir”.



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MEMORIAS DE UM BARMAN

                                                          Romildo Labigalini

         Antonio João de Toledo Lima, mais conhecido como “Beirute”, residente em Aguas de Lindóia é um grande amigo meu. Nasceu em 1948. Quando moço, solteiro,  embora nunca tenha trabalhado num bar, foi tentar a vida em São Paulo e queria ser um barman e, para isso ia se esforçar ao máximo para ser um bom profissional.
         Seu primeiro emprego foi no bar da Boate Djalma, muito frequentado pelos artistas que estavam iniciando suas carreiras profissionais: Chico Buarque, Djavan, Elis Regina, Jair Rodrigues e outros do cenário artístico.
         Em 1971 passou a trabalhar no bar do Restaurante Trastévere na Alameda Santos, o mais badalado de São Paulo, de propriedade do italiano Augusto Cavicchia e sua esposa dona Franca. Quando jovem , Cavicchia residiu na França e juntamente com o ator Rodolfo Valentino dançava com as frequentadoras do melhor clube de Paris. Esse restaurante fechou as portas em 1981.
Beirute aprendeu muito trabalhando no bar desse estabelecimento e seus drinques eram muito apreciados. Nessa época teve a oportunidade de conhecer pessoas famosas, artistas, políticos, empresários e outras personalidades. Dentre os artistas conheceu: Otelo Zeloni, Ronald Golias, Jô Soares – na época faziam o programa humorístico na TV “A Família Trapo” –, Roberto Carlos, Wanderleia, Erasmo Carlos, Wanderley Cardoso, Maysa – era casada com André Matarazzo -, o ator Hélio Souto – casado com a filha do proprietário da destilaria da Pinga 51 -, Consuelo Leandro, Nair Belo, Irene Ravache, Chico Anysio, Aguinaldo Rayol, Ana Maria Braga – jovem ainda, loira, bonita, era repórter da TV Tupi e casou-se com um dos diretores da TV Globo e posteriormente com um banqueiro do Banco Nacional - e Hebe Camargo. Nessa época Hebe era viúva e conheceu o seu futuro marido Lélio nesse restaurante. Ele era casado, mas não viva bem com a esposa.
         Beirute também conheceu os apresentadores da TV: Carlos Nascimento, Marcia Mendes e Cilene Araújo - repórteres da TV Globo. Nessa época quem dominava a audiência era a TV Record e quando terminava os shows da emissora a maioria dos artistas ia até ao Trastévere.
         Entre os políticos que frequentava esse restaurante destacam-se: Paulo Maluf, Carlos Lacerda, Figueiredo Ferraz, Franco Montoro, Oestes Quércia, Fernando Henrique Cardoso, Claudio Lembo, Ulisses Guimarães, José Serra, Jânio Quadros e sua esposa Eloá (Jânio havia chegado do exilio e ia até ao restaurante dirigindo o seu Fuscão 72. Ele gostava de tomar caipirinha com a pinga de Lindóia), o ex-presidente Costa e Silva e sua esposa Yolanda. Conheceu também os cantores italianos:
Nico Fidenco, Ornela Valoni, Gigliola Cinquetti, Fred Bongusto, Rita Pavoni e outros. Também os empresários Antonio Ermirio de Morais-ele almoçava lá diariamente mas não consumia bebida alcoólica-, Maria Pia Matarazzo e seus irmãos Ermelino e Francisquinho, o Conde Cicillo Matarazzo e sua esposa Yolanda Penteado.
         Beirute, já casado, residia no mesmo prédio de Silvio Santos, que na época era apenas locutor da Rádio Nacional passando posteriormente para a Rádio Globo. Em 1981 Beirute passou a trabalhar no bar do Restaurante Davi’s na rua Oscar Freire ainda como barman. Nesse restaurante ele ganhou o 1° lugar num concurso de melhor drinque promovido pela revista Playboy. A receita é simples: uma dose de gim, gotas de vermute branco seco e uma azeitona. Ele trabalhou nesse local até 1991, voltando a residir em Águas de Lindóia e continua fazendo os seus deliciosos drinques... só para os amigos, em sua casa, e eu sou um dos privilegiados. Ótimo para mim, que bebo essa delicia e não pago nada. Vai um drinque aí?



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O COMPANHEIRO DAS MADRUGADAS

                                                         Romildo Labigalini – 2005

Estou ficando velho. Quando eu tinha menos idade dormia oito horas por noite. Hoje durmo apenas cinco e acordo aceso para pular da cama. Não sei se é insônia ou se as cinco horas dormidas me bastam. Dizem que conforme vamos envelhecendo, dormimos menos. Eu não acreditava que isso fosse acontecer comigo, pois sempre fui bom de cama, dorminhoco. Mas aconteceu.
Às vezes acordo de madrugada, levanto-me, vou para outro quarto e ligo o rádio. Ele já fica sintonizado na Rádio Cidade das Malhas FM, daqui de Monte Sião. Esse rádio me faz companhia nas madrugadas insones. Quando a maioria das pessoas está se levantando, o sono teimoso retorna em mim e volto para o aconchego da minha cama. É um desencontro danado. O meu relógio biológico já se adaptou a esse horário.
         Quando o dia vem surgindo, com o sol que acabou de se levantar e se espreguiçando, um canarinho-da-terra cantador, mesmo sem ter lavado os olhos e o bico começa a alvorada cantando tão bonito que estufa até o pescocinho. Minha esposa já colocou até nome nele: Zezé. Ela é tão “fã-nática” do cantor Zezé di Camargo, que vive falando do charmoso buraquinho no queixo dele.
Por falar em cantor, não é que a danadinha da minha esposa tirou uma foto com Jerry Adriani? Estão abraçados, e ela beijando seu rosto. Fiquei tão enciumado que resolvi fazer pique para ela, tirando uma foto agarradinho com a Nalva  Aguiar, minha cantora preferida. Coloquei essa foto num porta-retratos e deixei ao lado da foto deles.
Pito-pitou. Minha esposa me disse que a próxima foto que irá tirar será com o homem do buraquinho, o Zezé di Camargo. E que vai beijá-lo também. Se isso realmente acontecer, prometo que irei até ao Rio de Janeiro para tirar uma foto com a linda atriz Ana Paula Arósio, beijando-a na boca. Aquele sorriso e os lindos olhos verdes dela me fascinam.
Estou com receio que a TV Globo queira até me contratar para ser o galã da próxima novela. Se for para contracenar com a Arósio eu topo. E não vou cobrar nenhum cachê pelo meu trabalho. E tem mais: vou fazer de tudo para desbancar o Thiago Lacerda e o Gianecchini. Será uma disputa difícil, mas vou tentar!




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UMA VIAGEM INESQUECÍVEL

                                       Romildo Labigalini

         Faz um bocado de tempo que estou montando a Árvore Genealógica da Família Labigalini/Labegalini. Pesquisei na internet, no Estado de São Paulo, nomes de pessoas com sobrenome Labigalini.
Escolhi um nome, ao acaso, de Sérgio Luiz Labegalini, residente em Marília e liguei para ele dizendo do trabalho que estou realizando sobre os descendentes da Família Labigalini. Ele foi muito atencioso e receptivo e me disse que iria colaborar no que fosse possível.
Um mês depois recebi um telefonema dele me convidando para participar do Primeiro Encontro da Família Labegalini (descendentes do César Labegalini), em Parapuã, distante 90 km, de Marília. Essa confraternização seria realizada na fazenda Ponteio, de propriedade de Valdir Ferrari e sua esposa Selma Labegalini, no dia 13 de outubro corrente.
         Aceitei de imediato o convite, pois eu queria tanto conhecer novos parentes e tinha plena certeza de que seria bem recebido. Nos dias subsequentes nos comunicamos por e-mails.
Como dia 12 era feriado (N.S.Ap.) e os parentes que residiam fora iriam chegar nesse dia, resolveram fazer um Pré-Encontro.
Dia 12, de manhã eu, minha esposa Nilza e meus filhos Marcio e Meire partimos para lá, viajando 570 Km. Eu já tinha informação onde era a Fazenda Ponteio, em Parapuã. Lá chegando, para identificar o local colocaram na beira da pista um pano branco amarrado a um pau, que balançava ao vento, parecendo saudar nossa chegada.
Na entrada dessa fazenda, uma faixa saudava os visitantes. Estava escrito “Sejam bem-vindos Família Labegalini”.
Fiquei emocionado ao ver escrito “Labegalini” num local tão distante de Monte Sião.
Chegamos na sede da fazenda e as primeiras pessoas que avistamos foram meus primos Aristides (Tidinho), sua irmã Janice e o marido dela Euclides De Nez, residentes em Marumbi-Paraná. Foi só alegria. O primo Sérgio Labegalini veio ao nosso encontro com sua esposa Andreia e os filhos Leonardo, Henrique, Gabriel e também sua mãe dona Luzia. Os anfitriões Valdir Ferrari e sua esposa Selma Labegalini e outros tantos parentes vieram nos dar as boas-vindas. À noite saboreamos uma deliciosa refeição.
         Na manhã seguinte começaram a chegar mais parentes e tive o prazer de conhecer alguns da minha faixa etária: Leondino Labegalini, com 79 anos ainda gosta de pescar e fica até 20 dias acampando, sozinho, na beira do rio. Os parentes o chamam carinhosamente de “Velho do Rio”. Seus irmãos Osvaldo, Maria “Guita” e Marcílio (descendentes de César Labegalini), os primos Romélio Labegalini seus irmãos Walmir, Luiz Carlos e Rivaldo (descendentes de Rissieri Labegalini), residentes em Mato Grosso do Sul, também vieram para a festa. Todos são descendentes do meu tio-avô Ângelo, irmão do meu nono Luigi Labigalini.
Do lado de fora da sede, uma barraca servia batidas, sucos, refrigerantes e água. Os garçons serviam cerveja e petiscos, tudo bem organizado. Na hora do almoço meus primos Sérgio e Selma reuniram todos os parentes em circulo, e de mãos dadas, fizeram uma bonita oração agradecendo a Deus pelo alimento e também a presença de todos que ali se encontravam.
         Depois do almoço meu filho Márcio exibiu um vídeo montado por ele sobre a imigração italiana: um navio partindo de um porto na Itália rumo ao Brasil, repleto de imigrantes mal acomodados, numa situação precária, e ao fundo a música “Mérica”, um hino dos imigrantes. Todos se emocionaram e choraram, por sentirem na pele o que nossos ancestrais sofreram para chegar ao Brasil em busca de uma vida melhor, ou seja, com menos sofrimentos.
         À noitinha minha filha Meire pegou o seu violão, sentamos na varanda do outro lado da casa, começamos a cantar e quem gostava de música vieram juntar-se a nós. Meus primos Sérgio, de Marília e o outro Sérgio, de Campo Grande também pegaram no violão e pandeiro e o ambiente ficou ainda melhor. Até meu primo Marcilio, que usava bengala, jogou-a num canto e dançou com uma meiga e carinhosa mocinha (talvez seja parente dele).
         O jantar, mais uma vez foi delicioso e a convivência com esses adoráveis parentes me deixou marcas de gratidão e agradecimento. Realmente foram momentos inesquecíveis.
         No domingo o cardápio era macarronada, mas os compromissos dos meus filhos na segunda-feira não poderiam ser adiados. Partimos de manhãzinha, passamos em frente a fazenda e o pano branco amarrado num pau ainda estava lá, como que acenando para nós e desejando-nos boa viagem de retorno. Olhamos para trás como se estivéssemos despedindo daqueles parentes maravilhosos e com muita vontade de ficar mais um pouquinho junto deles.

P.S.: Esse contato com nossos parentes aumentou mais 130 descendentes do meu tio-avô Ângelo: eram 154 e passou para 284.



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A TERAPIA DO TRUCO


                                     Romildo Labigalini-1993



         O tradicional jogo de truco foi introduzido no Brasil e em Monte Sião pelos imigrantes italianos. Aqui em Monte Sião, todos os domingos, após a costumeira missa matinal eles se reuniam em seus bares prediletos, tomando um puro vinho, cantando canções da distante e querida Itália e, como passatempo jogando bisca, bocha, malha e o barulhento truco bem ao gosto dos europeus.

         Na década de 50, o truco era muito disputado sendo os bares do Choque e do Ciro Grossi os pontos de encontro dos truqueiros, onde se reuniam, entre outros, os irmãos Zilim, Abílio e Mário Zucato, Ernesto Gotardelo, Rico Segundo, Gino Labegalini, José Vitor (atualmente com 93 anos, lúcido e ainda gosta de jogar), Aurélio Jacomassi, Lôla Guireli, os irmãos Geraldinho e Irineu de Oliveira, Júlio Colombo, Alair Monteiro, Gradim, Miguel Vitor e, dizem, o mais famoso de todos, Mancino Manganelo.

Ainda hoje, “seu” Mancino recorda-se daquela época com muita nostalgia, relatando suas brincadeiras e gozações durante uma partida. Mostrou-me os frangalhos de um diploma que “recebeu” naquela época da Liga Sul-americana de Truco, “assinado” pelo então Presidente da República Juscelino Kubitschek, onde era mencionado Campeão Brasileiro de Truco e o Terror do Sul de Minas. Ele me disse que esse diploma era de mentirinha, pois foi confeccionado aqui mesmo em Monte Sião pelo Lôla e Pascoal Andreta. Quando ganhava uma partida, querendo provar a sua superioridade, atirava-o em cima da mesa para provocar o adversário. E não ficava só nisso: levava sempre consigo um apito, um cachorrinho de pelúcia que latia e pulava, uma buzina de charrete e até um saquinho que, puxando-se uma cordinha, dava risadas. Afirmou-me, com um sorriso matreiro, que disputou um campeonato em Buenos Aires, na Argentina, e ganhou novo título de campeão, recebeu um troféu e o cognome de “El Professor Mancinê”. Disse-me orgulhoso que naquela época só existiam quatro campeões brasileiros: Maria Esther Bueno(tênis), Éder Jofre(box), Pelé(futebol) e ele, Mancino(truco). Que categoria!
Com o advento da televisão, o truco ficou um tanto adormecido, mas atualmente está em evidência, com a mesma gritaria de antes

Se alguém passar diante de um bar e ouvir aquela barulheira pensará que está ocorrendo uma briga. Até as mulheres já aderiram a esse “”esporte”, sendo adversárias ferrenhas. Os homens, sempre machistas, não se conformam em perder para elas, e quando isso acontece, é aquela humilhação.

De fato , esse esporte é um ótimo passatempo. À noite, após um dia de trabalho, nada melhor para relaxar com um divertimento sadio, de recreação, lazer e grande tradição. É um jogo de características marcantes de nossa gente do interior, onde a alegria se mistura com a habilidade, tudo numa confraternização de  pessoas, além de proporcionar novos círculos de amizades, união e companheirismo.

O bate-papo surge solto, descontraído e animado. Dificilmente aposta-se dinheiro. O mais comum é organizar um torneio entre duas turmas, apostando-se um jantar, sendo que a perdedora pagará as despesas.

Quando um jogador está com ótimas cartas, truca no seu adversário e este também está com boa jogada e manda seis tentos, a disputa fica acirrada: sobe-se na mesa ou na cadeira e, procurando humilhar e desmoralizar seu adversário, grita-se os mais variados impropérios: fundo de pinico, papudo, reboque de igreja velha, tranqueira, raspa de tacho, encardido, pastel do Zé do Tato, coxinha de Rodoviária, suprema do Pé-de-Porco, sino sem badalo, fundo de panela preta, marreco, pato, vagabundo, chiclete de onça, empadinha do Dú, sola do Lazinho, frangada do Mixirica, pinico de Santa Casa, sabonete de pensão, bunda-mole etc.

Em nossa cidade, alguns bares já instalaram pequenos salões para esse esporte que precisa ser mais difundido. Seria interessante se a Prefeitura Municipal organizasse um torneio anualmente, e a renda fosse destinada para as instituições de caridade.


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Dicas para fazer sexo na 3ª idade:

1. Use seus óculos.
2. Certifique-se de que sua companhia esteja realmente na cama.
3. Ajuste o despertador para tocar em 3 minutos, para o caso de você adormecer durante a performance.
4. Acerte a iluminação: apague todas as luzes. 
5. Deixe o celular programado para o número da EMERGÊNCIA MÉDICA.
6. Escreva em sua mão o nome da pessoa que está na cama, no caso de não se lembrar. 
7.Tenha DORFLEX à mão, para o caso de você cumprir a performance.
8. Não faça muito barulho; nem todos vizinhos  são surdos como você.
9. Se tudo der certo, telefone para seus amigos para contar as boas novas.
10. Nunca, jamais, pense em repetir a dose, mesmo sob efeito de VIAGRA ou CIALIS.
11. Não esqueça de levar 2 travesseiros para colocar sob os joelhos, para não forçar a artrose.
12. Se for usar camisinha, avise antes ao piupiu que não se trata de touca para dormir, senão ele pode se confundir.
13. Não esqueça de tirar a parte de baixo do pijama, mas fique com uma camiseta para não pegar gripe.
14. Não tome nenhum tipo de laxante nos dias anteriores; nunca se sabe quando se tem um acesso de tosse.
15. Repasse aos velhos amigos, já estou fazendo a minha parte.

Estas dicas foram escritas com letras grandes para facilitar sua leitura!





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ILMA EM TEMPO DE FÉ

                                                   Romildo Labigalini-1994

A noite estava gelada, prenunciando geada. No interior de um carro estacionado na rua, um casal, entrelaçado, aquecia suas emoções. No rádio, Leandro e Leonardo cantavam só para eles.
Abri o portão e caminhei até uma pequena casa aos fundos, bati na porta e Karina, de 9 anos, veio atender. Perguntei se sua mãe estava e ela respondeu afirmativamente. Ilma veio sorrindo como sempre e nos sentamos. É tão gostoso conversar com ela, as horas passam rápidas. Sempre me tratou de “senhor ”. Pudera, já colhi todas as primaveras do meu jardim.
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Conheci Ilma há 10 anos, numa ceia de confraternização. Estava acompanhada do seu namorado (posteriormente se casaram). Jovem, linda, olhos verdes, baixinha, longos cabelos loiros (nem percebi que eram oxigenados) e muito simpática.
Os anos correram, nasceu Karina e a união foi desfeita. Mas a vida continua e Ilma conheceu outro amor. O namoro durou anos. Meu relacionamento com esse novo casal era muito bom. Frequentemente, em companhia de outros amigos, nos reuníamos para jogar truco, tomar aperitivos, comer e jogar conversa fora. Certa ocasião, num carnaval, ficamos alojados num sitio, curtindo a natureza e a agradável companhia de todos.
Um dia Ilma e o namorado desentenderam-se e não houve reconciliação.
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Num sábado, em abril do ano passado, Ilma, em companhia de amigos, foi a um baile em Mogi Mirim. Quando retornavam, já em Lindoia, numa curva o motorista cochilou ao volante e o carro caiu numa ribanceira. Quem mais se feriu foi ela. Levada ao hospital, o médico suspeitou de fratura do crânio e a encaminhou para o hospital da Unicamp em Campinas. No trajeto ela teve duas paradas cardíacas, mas sobreviveu. Recobrou a consciência 5 dias depois. Ficou sabendo que havia sofrido também uma lesão na medula (1ª e 2ª vértebras) e teria que ser submetida a uma cirurgia arriscada. Os médicos que a trataram disseram aos familiares de Ilma que provavelmente, se ela vivesse, ficaria imóvel para sempre, vegetando pelo resto da vida. Mas Ilma tinha fé e a cirurgia foi um sucesso. Por ficar acamada numa mesma posição, veio uma embolia pulmonar, que foi debelada. Ela permaneceu 36 dias no hospital e está fazendo fisioterapia até hoje. Seu ex-namorado, mas bom amigo, a acompanhou desde o acidente.
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Fui visitar Ilma em Campinas. Estava imóvel na cama e não mexia um membro sequer. Somente os lábios e os olhos de esperança obedeciam a seus comandos. No pescoço, um colete (colar cervical) a impedia se mexer a cabeça. (Este colar a acompanhou durante 6 meses). O cabelo estava curtinho, escuro (tinham lhe raspado a cabeça). Estava linda, parecida com Elis Regina. Mesmo nessa situação, ela estava animada, com plena certeza de voltar a vida normal. Ilma tinha muita fé.
Prometi a ela que quando ficasse curada e pudesse segurar as cartas do baralho com ambas as mãos, eu daria um churrasco em comemoração ao seu restabelecimento.
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Depois de passar por tanta provação, hoje ela está feliz e quase recuperada. Apenas a mão e a perna direita ainda não estão totalmente normais. Mas nada não a impede de ter uma vida sadia. Ganhou de presente um computador de sua “mãe” Odete, que muito a estima. Este computador é uma agradável companhia para Ilma. Além de muita utilidade, ainda joga truco com ela, usando a linguagem popular do esporte: pato, marreco, vai ladrão, como corre o medroso, eu adoro ganhar.
Ela está fazendo um curso de computação e pretende dar aulas e também editar sua autobiografia. Quero ser o primeiro a adquirir o seu livro. Além de escrever, gosta também de ler, passear, assistir motocross e receber visitas(sua casa está sempre cheia de amigos). Sua filosofia brincalhona: “quando dá vontade de trabalhar, eu deito, descanso e espero a vontade passar”. Mas nada disso é verdade pois ela sempre gostou de trabalhar. Antes do acidente tinha seu próprio negocio, sempre foi batalhadora.
Quanto ao futuro, “está nas mãos de Deus. O que Ele reservar será aceito de bom coração”. Ilma é muito religiosa e seu lema é: “jamais desistir”. Ela é membro da Congregação Comunidade Evangélica e recebe todo carinho e conforto espiritual. Acha que recebeu um milagre e diz: “em tudo posso naquele que me fortalece”. Mas quando está sozinha, fica triste. Quer companhia e carinho. Tem certeza que vai acontecer muita coisa boa em sua vida.
Na passagem do Ano Novo que se iniciou, ela teve uma grata surpresa: comemorou a ceia em companhia do seu grande amigo e jogador de futebol do Palmeiras, Evair. O papo estava tão agradável que ficaram até as três da manhã.
Na orelha esquerda de Ilma, um pingente simboliza uma menina (sua filha) e realça ainda mais seu belo rosto. O cabelo continua escuro. Na estante, um barco de madeira adorna o ambiente. Quando ela estiver velhinha, depois de ter semeado paz, alegria e felicidade na terra, recordará do seu barco e dirá:
“Senhor, tu me olhaste nos olhos
A sorrir, pronunciaste meu nome.
Lá na praia eu larguei o meu barco
Junto a Ti buscarei outro mar”.


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O CONQUISTADOR AZARADO
                                                                                              Romildo Labigalini
            Toninho mecânico era chegadinho em “cantar” mulheres. Se uma boazuda passasse em frente à sua oficina, ele parava o seu serviço e a seguia com os olhos enquanto o pescoço aguentasse. Casado, cinquentão e os cabelos brancos pintados para aparentar menos idade. Certo dia uma conhecida sua, linda, corpo escultural, mas casada, telefonou para a sua oficina solicitando seus serviços para consertar uma lavadora de roupas na casa dela e pediu-lhe que fosse após às 17 horas, pois trabalhava durante o dia. No horário combinado Toninho pegou a caixa de ferramentas, chispou ansioso para lá e acionou a campainha. Ela, la dos fundos, perguntou quem era (estava tomando banho).
            - É o Toninho mecânico – respondeu.
            - Pode entrar, a porta não está trancada e a lavadora esta lá nos fundos!
            Ele entrou e sentiu o delicioso cheiro do perfume que vinha do banheiro e já ficou excitado. Revirou a lavadora de todo jeito e não encontrou nenhum defeito. Dai a pouco a pareceu ela, mais linda do que nunca, cheirosa, com um roupão azul-claro, transparente podendo-se notar sua calcinha e sutiã brancos e sentou-se no sofá em posição provocadora. Ele sentiu um calafrio na espinha, suas entranhas pareciam um vulcão prestes a entrar em erupção. O rosto foi esquentando e as pernas bambeando, trêmulas. Atirou-se numa poltrona antes que sofresse um treco. O coração batia descompassado.
Estava doidinho para atirar-se nos braços dela (que já o esperava de olhos fechados), quando um intruso pensamento veio em sua mente: o marido dela, homem valente e brabo, estava para chegar do serviço e se o encontrasse ali, haveria velório à noite. O vulcão foi perdendo sua intensidade, implodindo ate se acalmar. Ficou tão quietinho que não saiu nem uma fumacinha sequer. Ele se levantou e com a voz lá no fundo, ainda conseguiu balbuciar:
- Eu não encontrei nenhum defeito em sua máquina e se ela voltar a enguiçar, me chame que eu venho novamente.
- Tá bom – disse ela – pode ir e feche a porta.
            A partir daquele dia, quando se cruzam, ela nem olha pra ele, fingindo não conhecê-lo.
                                                                     ***
            Alguns dias depois, o Toninho se encontrava em um bar tomando sua cervejinha, em pé ao lado do balcão, como um gavião procurando a presa. Ele passando em revista todas as mulheres que ali se encontravam. Avistou uma gatinha loirinha, bonitinha, de olhos azuis, um xuxuzinho, sozinha numa mesa. Foi ate lá, pediu licença e sentou-se. Chovia muito, um toró e ele se ofereceu para leva-la para casa. Ela aceitou o convite e continuaram a conversar e beber. Ele, certo que dessa vez iria “faturar” a belezinha. Na hora de irem embora ele pagou a despesa e zarparam. No trajeto ele já fez o “convite”.
- Que é isso, tio? – disse ela – eu só aceitei a carona porque está chovendo muito. Eu só saio com moço jovem, bonito e somente por amor.
- E se eu lhe der um dinheirinho, topa?
- Agora piorou ainda mais. Não sou mulher da vida que transa por dinheiro. Boa noite, passe bem!
Desceu do carro e quase derrubou a porta.
***
            Num sábado Toninho resolveu ir a um forró num salão da periferia. Dançar era com ele mesmo. Ficar sacolejando naquele rala-coxa era uma delicia. Conquistou uma moreninha baixinha, bonitinha e combinaram irem ate a um motel próximo dali. Antes de saírem foi ate ao banheiro e tomou um comprimido azul, para dar maior “sustança” e garantir o sucesso no ninho de amor do motel. Não podia falhar de jeito nenhum. Como era casado e havia alguns bares repletos de fregueses logo adiante, e com receio de fossem vistos, combinaram para que ela se escondesse no porta-malas do carro, até passarem em frente aos bares. Assim foi feito. Ansioso, deu na partida e se arrancou. Logo adiante, após uma curva avistou as luzes piscantes do carro da polícia realizando uma blitz. Ordenaram que parasse, verificaram os seus documentos e estava tudo em ordem. Pediram que abrissem o porta-malas para certificarem de que não havia nenhuma arma ou droga escondidas. Toninho protestou e disse que não abriria, pois não havia nada dentro. Os policiais ameaçaram prendê-lo e também apreenderam o carro. Não teve outro jeito. Quando abriu o porta-malas, lá estava ela, encolhidinha, com os olhos arregalados e apavorada de tamanha vergonha. Os policiais pensaram que se tratava de um sequestro e disseram que iriam leva-los para a Delegacia de Polícia para esclarecer o caso. Depois que a moça explicou tudo, foram liberados. Toninho manobrou o carro, deu meia-volta, devolveu a moça ao forró e foi para casa. Iria aproveitar, com a esposa mesmo o resto do efeito do comprimido.
“Da próxima vez vai dar certo”, pensou.



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NÃO É FÁCIL SER REPÓRTER
(Publicado no Jornal Água Viva)
         Na África do Sul, zona de diamantes e ouro, passou-se o seguinte e que reputamos como verdadeiro:
“Um casal que foi fara lá à procura de diamantes, teve a ventura de ver o lar enriquecido com o nascimento de um filho. O marido comunicou o acontecido por meio de um dos maiores jornais em circulação, dizendo que o seu tesouro tinha nascido com o peso de 6 quilos. Porém a imprensa entendeu que o homem havia achado um tesouro, um diamante com o peso de 6 quilos e mandaram para lá um repórter que, ao chegar lá, bateu à porta e quem atendeu foi a esposa do senhor Tobias, estabelecendo-se o seguinte diálogo:
Repórter -  O senhor Tobias está?
Mulher – Lamento, mas ele saiu.
Repórter – Soube que ele encontrou um tesouro de 6 quilos!
Mulher – É verdade(achando graça).
Repórter – Pode mostrar-me o lugar onde foi achado?
Mulher – Meu marido não gostaria.
Repórter – E a mina fica muito longe?
Mulher – Não... fica é muito perto.
Repórter – Seu marido foi o primeiro a cavar a mina?
Mulher – Ele pensa que foi.
Repórter - O trabalho foi muito difícil ?
Mulher – A principio sim, depois tudo bem.
Repórter - O buraco que cavou é úmido ? Ouve resistência ?
Mulher – A resistência foi mínima e a umidade pouca.
Repórter – Sempre vai ao fundo do buraco?
Mulher – Com muita frequência.
Repórter – Acha que tem mais de onde esse veio ?
Mulher – Claro que sim, basta querer.
Repórter – Depois de achar o tesouro entrou de novo no buraco?
Mulher – Ontem à noite mesmo.
Repórter – Alguém costuma ajudar no trabalho?
Mulher – Apenas eu.
Repórter – Será que seu marido não arrenda este buraco?
Mulher – Acho que não, ele gosta dele.
Repórter – posso ver o tesouro achado?
Mulher – Pois não. (E foi buscar a criança)
         O coitado do repórter quase morreu do coração.”



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Meu Parente Centenário

   Olindo Labigalini é meu parente, e o mais idoso da nossa família. Reside em Itapira com seu sobrinho Ademir, mais conhecido como “Vagalume”. Com 100 anos de idade é lúcido, goza de boa saúde e gosta de conversar, apesar de sua audição não estar muito bem.
   Ainda vou conhecer o sítio onde ele morava no bairro dos Forões, município de Itapira e tentarei fazer uma crônica sobre ele e sua família. Um abraço Olindo.



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Recordação
Maria Aparecida Labegalini (Tidinha)

        Na época em que o nono Batista Labigalini e a nona Bastiana foram morar em Ubaúna, no PR, ganhar dinheiro, nós fomos visitá-los. Lembro-me que quando apontamos na rua em que eles moravam, com as malas nas mãos, a nona, que estava na frente de sua casa, saiu em disparada na nossa direção, gritando “meu filho, meu filho”. Ela deu um abraço tão apertado, demorado e emocionado no meu pai, que todos pararam pra ver; e em seguida, em nós.
        Foi uma alegria e uma choradeira. O lugarejo naquela época era de assustar. Não havia saneamento, esgoto, energia, nada que pudesse oferecer conforto e praticidade. Tudo era difícil, começando pelos banheiros, bem separados da casa e cada um com a sua função: um para banho, que funcionava com um balde cheio de furos na base, que se enchia com a água aquecida no fogão e se suspendia rapidamente com uma corda, para não haver nenhum desperdício. Nós, crianças, tomávamos banho de bacia. O outro banheiro, para as outras necessidades, era à base de fossa, com um caixote de madeira servindo como assento. Minha mãe morria de medo que nós, crianças, caíssemos lá. Uma tarde, quando meu irmão sumiu por algumas horas, foi um corre-corre danado na vizinhança, entrando em todos os banheiros, até que escutamos um som na rua, anunciando o circo que havia chegado, e lá estava ele, o Paulo, no meio do desfile, feliz da vida. Foi um alívio e muita risada veio depois, com esta estória.
        Nesta época, eu estava no 1º ano do grupo. Levei meu caderno de capa cor-de-rosa para a nona ver e ela, mesmo não sabendo ler, folheou as páginas, elogiou e eu fiquei toda contente.
        São lembranças boas, que me enchem de saudades. Saudades daquela comida boa: polenta, frango refogado e cheio de tchótcho, ovo frito e verdura cozida. Saudade da sanfona do nono, de vê-lo tocando com os olhos fechados, para sentir na alma a doçura da música.
        Quando me remeto a estes momentos de recordação ao lado deles, sei que fui feliz, porque às vezes me pego com o pensamento longe, os olhos também fechados e um sorriso na cara: tudo de bom, embora uma lágrima sempre apareça no canto dos olhos.



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MEU PRESENTE DE NATAL
                                                  Romildo Labigalini-2007
         Faltava apenas cinco dias para o Natal. Papai Noel , prevendo que teria muitas entregas a fazer, resolveu antecipar o meu presente ansiosamente aguardado e muito amado, mesmo antes de chegar. E ele chegou. Seu forte choro anunciava que veio para vencer e lutar com toda sua força.
É o meu netinho Pietro, filho de Marcelo e da sua namorada Caroline Monteiro. Nasceu moreninho, da cor dos pais, lindo, com fartos cabelos negros, detalhe esse que causou muita inveja em mim e ao outro avô Eraldo Monteiro.
Pietro nasceu guerreiro, lutador, um herói que aguentou firme as difíceis fases da gestação da sua mãe: último ano da Faculdade, muito estudo, trabalhos, viagens para São Paulo e um repouso absoluto por um longo período. Ele, embora ansioso em nos mostrar sua linda carinha, suportou com galhardia e paciência o tempo necessário. Na fase final da gestação, ele dava fortes ponta-pés na barriga da mãe,  talvez para avisar que estava tudo bem, saudável, ou quem sabe, estava treinando para ser um bom jogador de futebol como foi  seu bisavô Último Labigalini, beque central do famoso time do Bairro Labegalini. Tomara que Pietro seja Palmeirense.
Sua mãe Caroline também é uma guerreira e merece medalha de ouro. Passou por tudo isso sempre alegre e sorridente. Sabia que para ter esse lindo filho, valeria a pena qualquer sacrifício. Cinco dias antes do parto, ela teve uma torção no joelho e foi necessário colocar talas. Mesmo assim, ela estava radiante e feliz, pois o “esperado” iria chegar e ela queria aninhá-lo em seus braços e amamentá-lo. Felizmente tudo correu bem, com final feliz.
         Tenho certeza que Pietro será um vencedor e dará muito orgulho e alegria a todos nós, seus familiares. E é bem provável que será um apaixonado por cavalos, como seus pais.
         Todas as noites, antes do sono chegar, concentro meus pensamentos nele, abençoando-o e adormeço com um sorriso de felicidade.



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A CRIAÇÃO DO MUNDO - SEGUNDO JOÃO MARTINS
                                                        Romildo Labigalini
         João Martins, nordestino de Caruaru, Pernambuco, é um grande amigo meu. Pequeno na estatura, grande no coração, é uma pessoa simpática, culta, inteligente, poeta, cantor e contador de “causos”. É porreta mesmo. Tive o privilegio de conhecer sua cidade e também sua bela família: a esposa Norma e as filhas Luana e Jéssica(estas o chamam carinhosamente de paínho). Empresário em Caruaru, João revende tricô de Monte Sião, contribuindo portanto com o progresso de nossa cidade. João disse que o relato a seguir não é de sua autoria e não se encontra na Bíblia. É apenas um “causo” que ouviu. É assim:
Deus, quando criou o mundo, quis identificar cada coisa ou ser, colocando os devidos nomes: plantas, peixes, animais e tudo que existe no Universo. Como exemplo escolheu 4 animais para colocar os nomes, determinar suas funções e o tempo de vida de cada um. Chamou o primeiro e disse:
-Você se chamará BURRO. Vai carregar a cangalha no lombo, será um animal muito útil e sua comida será o capim. Vai carregar paus, pedras, tijolos e servirá de montaria aos homens e viverá 40 anos.
O burro respondeu:
-Senhor, depois de tanto trabalho e ainda ser chamado de burro, não desejo viver 40 anos. Dê-me somente 20.
- Tudo bem – disse o senhor – então serão 20 anos.
Deus chamou o segundo e disse:
-Você se chamará CACHORRO. Também será um animal muito útil aos homens, servirá como vigia na casa deles, será roedor de ossos e sua alimentação será restos de comidas e viverá 20 anos.
O cachorro respondeu:
- Senhor, para eu ser tudo isso, ficar sem dormir vigiando a casa do meu dono e ainda ser chamado de cachorro, também não desejo viver 20 anos. Dê-me somente 10.
- Está bem – disse o senhor – você vai viver 10 anos.
Deus chamou o terceiro e disse:
- Você vai se chamar MACACO. Nunca terá paradeiro na vida, irá pular de galho em galho e vai ser humorista para alegrar as crianças. Viverá 20 anos.
O macaco respondeu:
 - Senhor, minha vida será muito sofrida. Dê-me somente 10 anos.
- Está bem – disse o senhor – você vai viver 10 anos.
Deus chamou o quarto e disse:
- Você vai se chamar HOMEM. Será o rei dos animais e terá o poder sobre tudo e todos na face da terra. Terá uma esposa carinhosa e filhos para formar um lar. Logicamente vai ter que trabalhar para o sustento da família. Vai viver 30 anos.
O homem pensou, pensou e disse:
- Senhor, dê-me mais um pouquinho, quero curtir mais a vida.
- Trinta anos será melhor para você!
- Vamos fazer um acordo, um arrumadinho?-disse o homem- Dê-me os anos que foram rejeitados pelos outros três: 20 do burro, 10 do cachorro e 10 do macaco. Somando tudo são 40 anos. E mais 30 que o Senhor já me deu, são 70. Considero uma proposta razoável.
- Pode ser – disse Deus – eu aceito sua proposta desde que seja na seguinte condição:
Durante os 30 anos que eu lhe dei, você será HOMEM e poderá fazer o que quiser durante esse período: namorar, casar e constituir família. Dos 30 aos 50 (vinte anos que sobraram do burro), você será comparado com a vida do burro(geralmente nesse período o homem carregará pedra, paus e tijolos para construir sua casa). Dos 50 aos 60 (dez anos que sobraram do cachorro), você será comparado ao cachorro (é a fase em que os filhos, já moços, frequentam bailes, cinemas e outras diversões e chegam tarde em casa. O pai, preocupado com chegada deles, dorme pouco e levanta diversas vezes durante a noite para abrir a porta. É o vigia da casa). Dos 60 aos 70 (os dez anos que sobraram do macaco), será comparado a ele (nessa idade o homem já estará aposentado, tem tempo disponível para visitar os filhos que talvez estejam residindo em outras cidades e passará dias na casa deles, estará pulando de galho em galho).Quando chegar na casa dos filhos, pega os netinhos no colo e fará brincadeiras, micagens e agrados para estes sorrirem.
         O HOMEM aceitou a proposta e Deus concluiu:
- Sua existência na terra será como combinamos.
         Eu estava concluindo esse artigo, quando ouvi o dim-dom da campainha. Abri a porta e adivinhe quem chegou? Acertou ! O próprio João Martins, com um largo sorriso e um abraço para me dar.
- Entre, seja bem-vindo!



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Águas que não Movem Moinhos
José Antônio Zechin (Extraído do Jornal “Monte Sião”, 2009)

         Os ditos populares são sempre sábios. Um deles ensina que águas passadas não movem moinho. Pura verdade! O entendimento é simples: depois que passa pelas rodas do moinho, a água não mais retorna, e assim não pode mais mover o moinho e gerar energia ou qualquer tipo de trabalho. Passou acabou! Outro ditado que diz que a água parada apodrece. Também é verdadeiro. Água não é para ficar parada. Deve servir para alguma coisa. Igual ao dinheiro. Dinheiro parado não movimenta a economia. E economia parada é sinal de problemas. Será que existe alguém que ainda guarda dinheiro no colchão?
         Dia desses recebi uma historinha pela Internet que acabei apagando sem querer. Mas guardei a ideia, que recrio aqui com as minhas próprias palavras. Uma pessoa chega numa cidadezinha qualquer e vai se hospedar no único hotel existente. Faz um adiantamento de quinhentos reais e sai para cuidar de seus negócios. Nesse meio tempo, o dono do hotel pega os quinhentos reais e vai pagar o supermercado onde fizera compras. Este pega o mesmo dinheiro e vai pagar o açougue onde devia o mesmo valor. O açougueiro, por sua vez, vai pagar o fornecedor de carne. Este vai pagar um pedreiro que havia feito um serviço na sua casa. O pedreiro pega o dinheiro e vai pagar a costureira que vai pagar um advogado que tinha feito um trabalho para ela que vai pagar o hotel onde tinha ficado hospedado. No final, estavam todos muito contentes porque tinham liquidado suas dívidas. Nesse momento, volta o hóspede que diz que não vai mais precisar ficar na cidade e pede seu dinheiro de volta. O dono do hotel devolve o dinheiro e o estranho vai embora. Entendeu o que aconteceu com o dinheiro?
         Dia desses também encontrei um tio que já passou dos 85 anos e tivemos uma conversa simples, igual à historinha aí de cima, só que de verdade. Com toda sua idade, teve lucidez para perceber o que acontecera. Eles venderam um sítio. Com o dinheiro, as filhas compraram casas e terrenos. Adquiriram móveis novos e deixaram os antigos para os vizinhos, que deram os seus para outras pessoas necessitadas. Uma das casas adquiridas foi a minha. Com a venda, comprei um apartamento de uma pessoa que queria vendê-lo para comprar um terreno e construir uma casa. A pessoa que vendeu o terreno para ela mora em São Paulo e vai usar o dinheiro para outra transação. Nesse tempo, foram ainda feitos vários outros negócios: caminhões fretados para fazer as mudanças, compras em lojas de móveis, eletrodomésticos, cortinas, serviços de cartório e advogados, mudança de linha telefônica, pedreiros e pintores para reformas nos imóveis, logo, gastos em lojas de materiais de construção e pintura e tantos eteceteras. Sem contar o churrasco que foi feito para comemorar e que no sítio será construída uma escola! Enfim, deu para entender? Investimentos geram investimentos.
         Eu nunca tive um comércio próprio. Mas meu pai teve armazém, padaria, mercearia, uma fabrica de linguiça. Meu irmão ainda está nesse ramo. Um primo tem pizzaria. Tenho muitos amigos que têm todo tipo de negócio. Não sou um expertise nesse assunto, mas conheço um pouco do que seja comprar e vender, fazer estoques, capital de giro, lucros e perdas, aplicações financeiras, riscos nos negócios... Sei que, para que haja saúde financeira, o dinheiro preciso entrar e sair. É preciso que as águas movam os moinhos.
         Se você que está lendo essas mal traçadas linhas for um comerciante, empresário ou profissional liberal, gostaria de fazer uma simples perguntinha: você não está guardando dinheiro no colchão, está?



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NOVAMENTE OS APELIDOS
Romildo Labigalini - 2006

            Tempos atrás fiz uma brincadeira com os apelidos de pessoas aqui residentes. Posteriormente descobri outros. (As palavras maiúsculas são os apelidos).
            O Zé Francisco, proprietário do sitio Campo BELO, levantou-se cedinho, ainda com NEBLINA. Ele mesmo preparou o reforçado CAFÉ da manhã: um PÃOZÃO com SALSICHA, PASTEL e LEITINHO. Terminada a refeição, passou a mão no BIGODE, colocou um pedaço de JABÁ e um doce de GIBI no embornal e saiu para arriar seu CAVALO baio. Colocou um PELEGO na sela e foi vistoriar a propriedade. Nas margens do rio avistou alguns bichos que estavam bebendo água: ARIRANHA, uma PAQUINHA MAGRA, sem GORDURA, e um URSO pardo. Quando chegou, o PASTOR da sua igreja estava lá, pescando CARÁ. Nas margens desse lago um enorme JACARÉ parecido com um DRAGÃO e seus parentes LAGARTO e LAGARTIXA cochilavam tranquilamente ao sol. Perto desse lago encontrou um MARRECO, MARUJO aposentado, GAGUINHO, sentado em uma PEDRA, pensativo, com uma CANETA na mão. Estava escrevendo uma carta para a sua namorada SEREIA, pois seu CORAÇÃO batia apaixonado. E desse casamento o Zé seria PADRINHO. Nos galhos de um pé de JATOBÁ, algumas aves (TANGARÁ, SABIÁ, PARDAL e um POMBO) estavam famintas, com vontade de comer ALPISTE. No outro galho, o marido da CORUJA, macho agourento, FEIO, NERVOSO e MACUMBEIRO, fazia uma MACUMBA braba para o seu inimigo ESQUILO. Uma ABEIA, com CABEÇÃO grande e um corpo FININHO, juntamente com um BESPÃO MAMANGAVA, voavam sobre as árvores em busca de flores. No pasto o JUMENTO e o JEGUINHO, tranquilamente comiam CAPIM e abanavam os rabos para espantar um inoportuno MOSQUITO. No chiqueiro o PORQUINHO CARIOCA estava GORDINHO. Das ruinas do CABRITEIRO só sobrou um BODE velho, com um FURINHO no queixo e um longo cavanhaque fedendo BACAIAU. No terreiro um FRANGÃO, GALOTE ainda, com o PÉ VERMEIO de terra, estava LOUQUINHO para cantar de GALO. As demais aves, SARACURA, ANGOLA e um PINTINHO órfão, com o ZOÍNHO triste, ciscavam alimentos. Chegando em casa, Zé ficou contente quando seu filho NEGÃO, BAMBAM  no volante, veio lhe contar que havia comprado uma JAMANTA com TURBINA,  para transportar uma grande BOIADA para KALORÉ, no PARANÁ. Embora fosse barulhenta igual a um TERREMOTO, a compra foi boa. Seu GATO de estimação passou correndo, perseguindo um intruso RATINHO.
            Cansado da cavalgada, o Zé sentou-se na sombra de uma SAMAMBAIA. Enquanto pitava seu FUMINHO observava o PRESÉPIO todo iluminado, que sua esposa havia montado. Ficou LINDINHO. Para visitá-lo chegou o SAGUI, um BOY, comendo uma BANANA e mancando de uma perna, pois havia levado um tombo devido a uma PINGAIADA e surgiu uma ÍNGUA nas virilhas. Na hora de partir, pôs um CHICLETE na BOCA, sentou-se no seu BUGUINHO, saiu em disparada e atropelou um TATU, que ficou MORTINHO com o PÉ-NA-COVA.
            Viajando, foi até a casa da sua amiga RAPOSINHA, que tinha uma BELA FRANJA no CABELINHO e estava batendo PETECA. Desabafando disse a ela: - Até hoje VIVI com o meu SALÁRIO, mas agora não dá mais. Vou ser BISCOITEIRO, vender BIJÚ, ABÓBORA, BATATA, GOIABA, POCAN, BERINJELA e tudo o que puder. Quero ficar RIQUINHO.


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Descendo a Rua Direita
(Márcio Labigalini – 18 de fevereiro de 2013)



Meu ponto de partida é a praça de Monte Sião. Dentro do coreto, de frente para a Igreja, ainda vejo os ciprestes antigos do meu pensamento de menino, aquelas obras de arte do “Seu Estevão”. Giro um pouco para a direita e vejo o antigo casarão dos Pennacchis na esquina. Inicío, então, a minha descida pela Rua Direita.
Rapidamente sou guiado pelo cheiro de um doce familiar e entro na padaria à minha esquerda. Do lado de lá do balcão vem o Mário Labegalini ao meu encontro, que me serve um bombocado, com seu tradicional “oooobrigado”. Saio da padaria e vejo os irmãos Zucato, o Ney e o Rubens, na farmácia ao lado. Continuo minha descida e do lado esquerdo vejo outra farmácia do Sr. Assumpto Volpini e lá dentro o “seu“ Raimundo (todo de branco) lendo algo interessante.
Um pouco mais a frente ainda à esquerda, vejo o Aurélio Jacomassi saindo de sua casa. Então, vejo o Bar do Peri e lá dentro o “seu” João e o Toninho Comuni conversando. Cumprimento os dois que me acenam alegremente.

Escuto as batidas das bolas de bilhar e vejo o Vitório Cétolo em seu bar na esquina em frente. Na outra esquina vejo o casarão dos Canelas e corro pra casa da nonna Narcisa Comuni. Antes de chegar, passo correndo pelo “seu” Renato Franco Bueno e sinto o cheiro de couro da sua loja, onde fabrica selas.

Dou duas batidinhas na porta da casa da nonna e entro, como sempre fazia. Na salinha à direita vejo o “Tio” Lúcio Canela conversando com seu pai, o Adolpho Canela, que ainda estava em sua cadeira de rodas. Peço “bença” aos dois e corro prá cozinha. Lá dentro aquela enorme mesa, eu tão pequeno e ela tão alta, cheia de macarrão caseiro e gnocchi na farinha, onde não resisti, estiquei os pés e peguei um. Assim que coloquei na boca a nonna Narcisa veio brava (com seus olhos claros) e disse-me que comer cru fazia mal. Colocou o pano de prato nas costas e chamou:

 - Maria!

Vejo então a minha madrinha entrando, já com seus cabelos brancos, mas sem a bengala. Pedi sua benção, me lembrei do vô Último Labegalini e saí correndo da casa da nonna.

Do outro lado da rua vi o Davino trabalhando no açougue. Mais abaixo vi o professor Carlinhos Francisco, sorrindo -me e acenando a mão. Ao lado da sua casa vi a antiga central telefônica e entrei. Lá a telefonista parecia enroscada em meio à tantos cabos e vi o número 165, telefone do meu avô.

Saí de lá e vi o Flívio Monteiro e sua mulher dona Odila Andretta. Antes do hotel, vi o Miltão de Castro e logo a seguir, o Rafael Guarani, com seus eternos óculos escuros. Senti o cheiro de pão e vi o “seu” Pedro Galbiati e sua esposa dona Palmira na padaria. Entrei e pedi um arroz-doce. Saí de lá e vi o “seu” Plácido Bernardi em sua loja descansando na cadeira de balanço.

Na janela da casa da esquina do lado direito, vi a avó Emília Gotardello conversando com seu filho Jair Zucato.

Ouvi então um violão e uma clarineta. Na outra esquina, dos Moteranis, estavam ensaiando o Ugo Labegalini e o Pascoal Andreta, que me chamou de Rumirdinho.

Olhei para a casa do meu avô e vi um menino cabeludo descendo as escadas com as chuteiras nas mãos. Subi a escada vermelha, abri a maçaneta da porta e entrei, mas lá dentro não havia ninguém.

Desci correndo e vi o menino indo na direção do campo de futebol da Prainha, perto do rio no final da rua.

Na casa a seguir ouvi uma conversa com sotaque italiano e lá estavam o Tio Batista e Tio Antônio, mas não o meu avô. Perguntei onde ele se encontrava e disseram-me que tinha ido ver o Luizinho jogar futebol naquele campinho. Entendi então que aquele menino era o meu Tio Luiz e corri na direção do campo.

Mesmo com pressa, vi o “seu” Tonico Canela e sua esposa dona Adalgisa na janela do sobrado deles. Depois vi o Zé Alexandre Bernardi conversando com a sua mãe dona Cidinha e passei em frente do antigo armazém do Atilio Corsi. O caminhão do Dalo estava saindo do antigo armazém do vô Último e vi o tio Étore Nicioli, que gritou, abrindo um sorriso e ainda mais os olhos: - Tô indo pra Jacutinga!
Continuei em frente, até que cheguei ao campo da Prainha. Lá vi o Jair Codorna, o Gordo e o Tio Luiz, já sem cabelos, orientando um jogo do “Garapa”. Mas não vi meu avô.
Abracei meu Tio Luiz e perguntei-lhe onde estava meu avô e ele me disse que seu pai havia retornado para casa.

Resolvi voltar para lá, já sem tanta pressa, e senti o cheiro do biscoito caseiro do Dito Cirino. No fundo da casa, vi o forno e ele me deu um biscoito para saborear.

Em frente da casa do meu avô, vi o Canelão e sua esposa dona Helena Canela com uma criança no colo. Apareceu, de repente, uma senhora de uns 38 anos de idade, que eu não reconheci e pegou o menino no colo levando-o para dentro da casa do meu avô.

Mais uma vez subi correndo as escadas e abri a porta da casa dele, novamente deserta. Procurei em todos os cômodos e não vi ninguém, só o telefone preto antigo, entre a copa e a sala. Peguei meu celular e disquei o número do telefone do meu avô, 165: O telefone tocou e um clarão azul veio do quarto, de onde meu avô saiu pra atender com seu sotaque italiano:

- Prrooonto!

- Bença Vô.

- Deus te abençoe Marcinho!

- Vô, quem era aquela senhora com o bebê no colo que entrou aqui?

- Era a sua vó Júlia Taveira, minha primeira esposa. Ela veio trazer o nosso filho Zé Otávio para permanecer junto de nós.



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“CAUSOS” DO BETO RELOJEIRO
                                               Romildo Labigalini
         Beto Relojeiro é um amigo muito espirituoso.Nas nossas conversas no Bar do Geraldo, ele sempre narrava alguns fatos divertidos, talvez para alegrar a todos, ás vezes exagerando um pouco para dar mais brilho às suas narrativas.Eis algumas delas:

Quando tinha 19 anos,era frequentador assíduo da zona do meretrício em Ouro Fino, tornando-se amigo da dona de uma das casas,um mulherão, um avião chamada Gaúcha, morena linda e reforçada.Ele estava mais para um teco-teco, baixinho e magrinho.
Num sábado de carnaval, ele, com alguns amigos foram se divertir naquela cidade, no Clube União. Constantemente havia brigas nesse clube por rixas entre os moços de lá e outros daqui. Seus amigos arranjaram namoradas e saíram do salão, deixando-o sozinho. Alguns inimigos seus percebendo isso, partiram para cima dele para agredi-lo. Diz o Beto que eram 90 pessoas. Sozinho, para se defender, dava 90 murros por segundo, mais rápido que o bater de asas do beija-flor. Já estava exausto quando sua amiga Gaúcha, que também se encontrava no recinto, veio em seu socorro. Sacou um pequeno revólver que estava escondido no sutiã, fez um disparo para o alto e disse que quem se aproximasse levaria bala. Todos se recuaram e ela o levou para a casa dela, onde ficou alguns dias até se recuperar, pois nem conseguia levantar os braços. Sua recuperação demorou três meses. Como sempre acontece com suas peripécias, não teve nenhuma testemunha para confirmar este fato.
***
         Beto e alguns amigos foram pescar na represa de Furnas. No dia seguinte, devido a muita chuva, não conseguiram pescar. À noite resolveram chegar até Alfenas, e foram para a zona. Lá chegando, ele, “beudo” entrou em algumas casas de prostitutas mas não simpatizou com nenhuma. Caminhou mais à frente, amparando-se nas paredes e entrou em uma casa onde se encontrava um senhor com sua esposa e um filho assistindo TV. Sentou-se no sofá, ficou assistindo também, aguardando a chegada das moças e cochilou.Quando acordou, levantou-se, deu uma espreguiçada e perguntou:
- A que horas que as putaiadas vão chegar?
O senhor respondeu educadamente, que a casa era de família e lhe disse que quando as luzes fossem vermelhas, eram casas de prostitutas e quando normais, de família. Beto se desculpou e deu no pé.
***
                Beto, já casado, mudou-se para Ouro Fino, mas continuou trabalhando em Monte Sião em sua oficina de concerto de relógios e tinha muita amizade com o Carlinhos Cadan, dono do bar da Rodoviária. Carlinhos voltou de uma pescaria e trouxe muitos peixes, entre eles um bagre africano de 3kg que colocou no freezer. Passados 30 dias presenteou o Beto com esse peixe super congelado. Contente com o presente, levou-o para casa colocando-o no tanque de lavar roupas. Abriu a torneira para descongelá-lo e disse para esposa prepará-lo para o jantar e foi tomar banho. Ao sair do banho ouviu um barulho estranho vindo de fora e foi ver o que estava acontecendo. O peixe estava vivo, “corcoveando” e se debatendo. (começamos a rir pelo acontecido e ele desabafou, com um sorriso maroto):
- Não sei porque ninguém acredita nessa história!
***

         Numa sexta-feira Beto lembrou-se do aniversário de sua esposa, mas estava sem grana. Chegou em casa à noite, abriu uma cerveja e disse para ela:
- Meu bem, hoje é seu aniversário e eu não trouxe nenhum presente, mas amanhã iremos comprar um, bem baratinho. O que você quer?
 Ela respondeu zangada:
- Quero que compre um quilo de amendoim e um litro de catuaba para você que já não está mais dando no couro!

***
Beto estava tomando uma cerveja na rodoviária, quando chegou o Prefeito de uma cidade vizinha, seu conhecido, que pediu um café ao balconista. Este colocou a xicara com o café e o açucareiro sobre o balcão. Distraído, o Prefeito começou a tomar o café amargo, esquecendo-se de adicionar o açúcar. Beto, brincalhão, lhe falou:
- O senhor não morou no lance?
- Não, eu morei em Pouso Alegre, Poços de Caldas e Bueno Brandão.
- Está gostando de ser Prefeito?
- Que nada ! Não quero mais saber de politica. Após esta minha “gestação” vou dar o fora.
- E a zona como vai ?
- Como havia somente quatro mulheres feias e velhas, mandei fechar a zona.
- Estou falando da rural.
- A Rural estava muito velha, com o motor “fudido”. Vendi ela e acabei comprando uma Kombi.
         Como dizia o Ugo, fui!



***


MINHA PRECE
                                          Romildo Labigalini - 2006

Senhor , diariamente te agradeço:
Pela minha VISÃO – por enxergar as maravilhas da natureza neste mundo encantador.
         Pela minha AUDIÇÃO – em poder ouvir o lindo canto de um passarinho cantador.
         Pelo meu PALADAR – em poder sentir as delicias dos alimentos , o gostoso sabor.
         Pelo meu OLFATO – em poder aspirar o cheiro perfumado de uma flor.
         Pelo meu TATO -  em poder acariciar o meigo rosto do meu amor.
         Pela minha inteligência - em poder ser seu colaborador.
Pela luz da estrela -  que no infinito espelha todo o seu divino fulgor.
Pela magia da lua cheia - clareando a noite escura com todo o seu esplendor.
AINDA TE PEÇO
Para curar as dores das almas – que eu seja bom doutor.
Para ensinar semente coisas boas – que eu seja bom professor.
Que ao lançar minhas sementes  - que eu seja bom semeador.
Que eu tenha muita fé – e amar meus semelhantes com fervor.
Que eu ganhe meu sustento – com meu trabalho, honestidade e meu suor.
Que ao manobrar meu barco em ondas fortes - que eu seja bom navegador.
Que eu propague tua Palavra – como um apóstolo divulgador.
Que nos momentos de indecisão – seja meu orientador .
Que nossas crianças e adolescentes – tenham sempre bom protetor.
Que no inverno de minha existência – o sol me aqueça com seu gostoso calor.
Que ao volante nas estradas da vida – que eu seja bom condutor.
Que eu possa distinguir o bem do mal – como bom observador.
Que eu tenha sempre doces lembranças – e não guarde em meu coração nenhum amargor.
E obrigado por existir em minha vida alguém que me dá carinho, felicidade e faz de mim um menino sonhador.



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QUEM VÊ CARA NÃO VÊ CORAÇÃO
                                             Romildo Labigalini - 1993

         Conheço o amigo Lima há aproximadamente 6 anos. Vez por outra eu o encontrava na lanchonete do Pavilhão jogando sinuca com os amigos. Gozador, ele colocava a bola de snooker na boca sem dentes, fazendo caretas, arregalando os olhos, parecia um sapo. Tudo isso para divertir os presentes. Outras vezes eu topava com ele na lanchonete da Praça, “alegre”, pois havia tomado umas biritas. Cantava com uma voz de taquara rachada, dançava, imitava o Golias, o Costinha, improvisava versos, divertia todo mundo. Pelo seu porte físico franzino, baixinho, a boca murcha imitando Popeye, engraçado, e a sua facilidade de comunicação, cheguei à conclusão de que ele tinha muita vocação artística, talvez tivesse trabalhado em algum circo como palhaço. Deveria ter alguma história alegre e interessante para contar. Não sei por que motivo me chamava de “mestre”. Marquei uma entrevista com ele. À noite fui até sua casa e bati na porta.
- Vamos entrar “mestre”! Se acomode!
         Começamos a conversar. No decorrer do nosso bate-papo, percebi que ele não era alegre como eu julgava mas , sim, um homem triste, emotivo, pois passou por tantas provações que me deu pena. Seu nome correto é Sebastião de Lima, mas é chamado carinhosamente de Tiãozinho pelos familiares. Nasceu em 18 de junho de 1932 em Santo Anastácio. Sua família mudou-se para Martinópolis-SP.
         Penúltimo filho, aos 2 anos de idade ficou órfão de mãe. Seu pai não tinha condições de cuidar da família, precisava trabalhar. A solução foi doar os filhos, e a família foi dispersada. Uma família pernambucana que lá residia ficou com o pequeno Tiãozinho. Certo dia esta família mudou-se para São Paulo, levando o menino sem avisar ninguém.
         Os meses foram se passando , cinzentos para o garoto. Sofria maus tratos e apanhava. Sua pele clara e cabelos louros, eram contrastantes com a cor da sua nova “família”. Os vizinhos acharam esse fato estranho e chamaram a policia, que constatou os maus tratos. Ele foi levado para o Orfanato Instituto Modelo de Menores, na Av. Celso Garcia. Foi crescendo, fez um curso vocacional em fundição e tapeçaria, aprendeu música e tocava pistão na banda do Orfanato.
Ao completar 18 anos saiu do Orfanato para apresentar-se no Exército, servindo apenas 3 meses e foi dispensado por excesso de contingente.
Conseguiu trabalho em uma mercearia e precisava tirar a segunda via do seu registro de nascimento. Partiu para Martinópolis, onde tinha sido registrado. Lá chegando, no cartório descobriu o endereço de sua irmã mais velha, Judite, que já estava casada e residia em São Paulo, na Casa Verde. Eles não se conheciam. Voltando a São Paulo, dirigiu-se para a casa dela. Mesmo passados tantos anos, quando sua irmã abriu a porta, o reconheceu de imediato, porque ambos eram parecidos. Ela disse, chorando, para o marido:
- É o meu irmão Tiãozinho, que saudade dele!
Ela lhe contou que o pai havia falecido há 7 anos e deu o endereço das outras irmãs. Eles têm ainda um irmão que foi adotado quando ainda bebê, por um casal de crentes, mas não têm notícias dele.
Ainda solteiro, apresentou-se no Programa Silvio Santos, no Cine Sol, Vila Guilherme. Contou “Recuerdo de Ypacaray” e “Boemia”, classificando-se em primeiro lugar. Não quis seguir a carreira artística. Cantava somente em aniversários e em festas de fim de ano na firma. Foi amigo dos cantores Francisco Alves (falecido em 1952 num acidente de carro em Taubaté) e de Nelson Gonçalves, participando com eles de serestas no bairro do Brás. A música preferida era “Rapaziada do Brás”.
Adora Futebol e jogou até aos 45 anos. É um torcedor fanático do Corinthians. Já casado com Hilda Cordon, trabalhou nas firmas Eletro-Radiobras (hoje Jumbo Eletro), na Anderson Clayton e no Clube Atlético Juventus.
O casal tem 6 filhos: Suely, Roseli, Nilton, Marisa, Edson e Andréa e 7 netos. Quando ainda morava em São Paulo, seus sogros residiam com ele. A sogra estava doente e necessitava de uma cadeira de rodas. Lima fez um pedido ao programa do Bolinha e ganhou a cadeira. Foi buscá-la à noite e a pé, empurrando-a. Encontrou um bêbado, que o olhou. Curioso e lhe disse:
- Bonito, hein? Durante o dia você fica sentado na cadeira, pedindo esmolas e à noite empurra ela!
A sua vinda para Monte Sião, em 1985, se deve a seu filho Nilton, que trabalhava na Malharia Maradolph como tecelão. Quando aqui chegou de mudança, a primeira pessoa que conheceu foi o Rico Segundo. Entabularam conversa e o Rico já pediu para ele votar no seu grande amigo e candidato a prefeito José Pocai. Mas o rumo das coisas aproximou o Lima com o Todi-Paió, também candidatos, ajudando-os na campanha política. Quando Rita Cadilac esteve aqui em Monte Sião, apresentando-se num show, o Lima subiu no palco e deu um beijo no bumbum dela. Foi um show à parte.
- Eu sou paulista de nascimento, mas amo Monte Sião. Aqui não se ganha muito, mas sobrevive. Em São Paulo ganha-se mais, mas não há sossego. Já fui assaltado lá e voltei para casa sem dinheiro. Aqui se vive, lá se vegeta!
É funcionário da Prefeitura Municipal e trabalha no Pavilhão, cuidando do jardim e como tratador das aves do lago. Quando ele coloca a lata de milho nas costas, as “pataiadas” o seguem como em uma procissão. Ganhou um terreno da Prefeitura e vai construir uma casinha com a ajuda, em mutirão, dos seus muitos amigos. Conversa corretamente, empregando os verbos em seu devido tempo, tem boa memória e uma fina educação. Gosta de filosofar:
- A nossa maior Faculdade é a Vida: quanto mais se vive, mais se aprende.
- Criança e velho são o meu mundo. Gosto também da juventude.
- Pobre morre – rico falece.
- Pobre come - Rico ceia.
- Quero morrer sorrindo, embora não tendo dentes.
- Se eu pensar muito por não ter conhecido meus pais, fico triste ...
Seus olhos azuis marejaram ... continuou:
- Minhas irmãs mais velhas dizem que meu pai deixou um recado:
“Meus filhos, façam seu semelhante sorrir, nunca chorar e sejam honestos”. Por isso canto o dia todo enquanto trabalho. É prá alegrar, né? Eu sempre sou alegre, embora tenha passado muitas amarguras na vida.
De fato, ele tem alegrado as pessoas, principalmente as crianças. No carnaval, na matinê, ele foi fantasiado de Ronald Golias. As crianças adoraram.
Ele é mesmo um vencedor na vida. Criado sozinho, sem família, cresceu, casou-se e constituiu família. Merece nossos aplausos e também a frase que o Chacrinha sempre dizia:
- Palmas para ele, que ele merece!!!



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CHICÃO E SEUS “CAUSOS”

                                             Romildo Labigalini(1983)



         Francisco Alves de Carvalho é seu nome. Popularmente é chamado de Chicão devido a sua alta estatura. Pessoa simples, humilde, trabalhador, conversador e contador de “causos”. Apesar dos seus 60 anos de idade, ainda trabalha. Magro, chapéu de palha, sandálias havaianas exibindo o dedo mínimo do pé direito encavalado sobre o seu vizinho, devido a um “destroncamento”.

É casado há muito tempo com dona Carmem, mas o destino não lhe deu filhos. Apesar de sua carência financeira, adotou, desde pequena, uma menina chamada Rose que já está com 15 anos, o orgulho dos pais. Possuía um barraco no bairro Tijuco Preto, mas necessitou vendê-lo para poder fazer um tratamento médico em uma das pernas. Atualmente reside no sítio do Aires Volpini, no Bairro do Tanque. Sempre que há oportunidade, gosto de conversar com ele para ouvir os seus “causos” relatados no linguajar espontâneo do seu vocabulário.

Numa tardinha lá vinha ele com uma enxada ás costas, retornando para sua casa e nos encontramos.

-De onde está vindo, Chicão?

-“Eu tava limpano um quintá dum hospe qui mora na Casa Papular e quando comecei limpá encontrei um punhado de iscurrupião, qui dava inté gosto de vê. Daí vi que a fema ia na frente e os macho ia atráis, pareceno procissão. Chamei a muié dona da casa pra vê. Ela ripiô e falô: ‘Cuidado, Chicão, esses bicho vai matá ucê’. Eu rispundi prela:

‘Num tô nem isquentano a buneca’! Aí falei qui a única salução é comprá um veneno catingudo chamado bagacê, prá cabá cum eles. Já viu, em num tenho medo de nada, nem de miudunho, nem de grande. Prova disso é que um dia eu vi uma coisa esquisita bem lá no pique do Morro Pelado, tudo marela i falei prá mim memo:

“Vô lá em riba prá vê o que é aquela giringonça”! Incontrei o Ivan Mariano, fio do Gerardo cuma turmaiada drento duma barraca marela, fazeno uma baruieira, cantando musga di viola, na maió fuzarca da paróquia. Aí bebemo esquenta-rabo inté dizê chega. Quando eu ia desceno morro-abaixo, passando numa tocera de caraguatá, iscuitei um baruínho e logo pensei que era uma cascaver, mas dei de cara cum baita dum baé preto, um bicho feiúdo e peludo que bota medo em quarqué um, meno ni mim, num  tô nem aí. Juntei ele pro papo e comecemo a luitá. Vira prá cá, vira pra lá, ele sortô uma lambada no meu lombo que levantô faísca. Dei um currupio e lasquei um tapa no pé da zoreia dele que o baé sumiu do mapa. Acho que foi moitá drento da caverna dele.

Trodia encontrei o bicho di novo, numa noite que eu vortava duma festa. Eu rematei um bolo e vortava prá casa junto com a minha muié Carme. Quando ia passano no matinho uma coisa mi pucho prá tráis, caí e foi só bolo qui dispatifô. Levantei e meti o cassete nele, só que dessa veis apanhei tamém. Ele jogô uma mãozada de terra no meu zóio, que eu num inxergava nem pirilampo. Minha muié xingava arto, eu descia o coro em riba dele. Fiquei tudo isgalepado e istrupiado. Ai foi um milagre, ele sumiu otra veis. Quando chegamo im casa, a minha muié acendeu a lamparina e bum... dismaiô. Foi perciso tomá uma chiringada di injeção prá miorá.

         Quando eu era mai moço eu num tinha medo di nada, nem di mula sem cabeça, nem saci-pererê e otros bichos. Eu não saía da casa do Batista Begalini, pai do Ugo. Um dia, quando eu era rapaizinho, o Ugo me levô num piquiniqui no sítio do Dito Dorta, cuma turmaiada de criançada. Ele falô prá mim que não percisava levá nada di cumê, era prá levá só a boca. Dispoi qui cumemo o lancho inté enchê a pança i bebemo guaraná inté rachá o cano, o Ugo disafiô eu:

-Bamo luitá?

Falei prele qui era bobagi, mas ele tornô mi provocá. Daí foi a viage do corvo dele. Lúita prá cá, lúita prá lá, eu caí em riba da perna dele e ele garrô a gritá. Tinha quebrado a perna. Sustado, saí correno pro arto do pasto, qui nem viado arcançava eu. Fiquei iscundidinho quaje uma hora prá tomá um fôrgo. Daí a poco iscuitei um tiro, o chumbo passô raspano minha cara. Maginei que era a pulícia que tava me pregano fogo, mai logo vi que era o Dino Bernardi qui tava caçano cadorna. Dispoi disso iscondi na casa do Rico Segundo, fiquei mai di treis sumana lá, pruquê eu tava cum medo do “seu” Batista.
         Uma noite sentei no banco do jardim e arguém deu um tapinha na minha cacunda. Era o Begalini; nessa hora meu estamo inté gelô. Aí ele mi falô qui eu num tinha curpa de nada i qui era pra mim vortá a frequentá a casa dele. Dispôi  qui eu fiquei mais sacudido comecei a trabaiá com o seu Batista , viajano prá São Paulo. Naquele tempo eu erguia dois saco de farinha de trigo sem forcejá. Hoje tô véio e ferrujado. Tempo bão memo foi quando eu era mai moço, guentava pulá quatro noite de carnavá sem cansá um tiquinho. Certa veis a minha Carme fêis uma fantasia de índio prá mim: comprô os pano no seu Prácio, arrancô umas pena do pirú, tingiu prá ficá mais bunita. Arranjô cabeleira pustiça pra mim e eu fiz um badoque com frecha.
Fiquei parecendo um cacique. Fiz sucesso aqui em Monte Sião, nas Águas de Lindóia, Serra Negra e Socorro. Em Ouro Fino ganhei o primeiro lugá na fantasia. Hoje ela tá bem guardadinha numa caxa de papelão e o ano qui vem, se eu tivé vivo, vô saí cum ela. Vô matá o jacú!”



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O “PANELEIRO” - Romildo Labigalini




Sempre que eu ia abastecer meu carro no Posto da Rua Prefeito José Carlos Francisco, ficava observando um senhor simpático e alegre que estava sentado na calçada do Clube consertando panelas e outros utensílios domésticos. Era um vai-e-vem de pessoas, uma trazendo algo para conserto, outra levando o que estava pronto, parecia um pequeno formigueiro.

         Eu o conheço há muito tempo por “Paneleiro” e até aquele momento nem sequer sabia seu verdadeiro nome. Resolvi ir até lá e fiquei observando o tratamento sempre cortês que ele dispensava aos clientes: para uma criança, dizia “linda”, para uma senhora, “comadre” e a um marmanjo “Corintiano”. Fiquei sabendo que ele é Corintiano roxo.

         Quando cessou o movimento, começamos a conversar e sentamos no degrau da escada do Clube. Seu nome é Osvaldo Tavares de Menezes, 68 anos, casado e reside em Ouro Fino. Enquanto tem serviço aqui em Monte Sião ele vem, de ônibus, de segunda à quarta-feira e quando escasseia vai para outras cidades: Águas de Lindóia, Lindóia, Borda da Mata, Inconfidentes e Santa Rita do Sapucaí. Nesta cidade, como há muitos estudantes, tem também muitas panelas para consertar.

         Em todas as cidades em que trabalha, ele faz consertos gratuitos para a APAE, Creches e também a pessoas carentes. Aqui em Monte Sião já faz 43 anos que ele realiza esses serviços e graças à sua educação conquistou muitos amigos e diz, emocionado que esta é uma cidade abençoada por Deus. Por isso gosta do que faz, é bem-humorado e adora as crianças, que o chamam de “Tio Panela”. Ele fica todo contente com o carinho que recebe delas e sempre retribui com chocolates.

         Osvaldo nasceu em Valparaíso-SP e, ainda jovem mudou-se para São Paulo e foi trabalhar na fábrica de panelas “Clock”. Foi lá que aprendeu esse ofício. Posteriormente trabalhou na montadora “Mercedes-Benz”, em São Bernardo do Campo. Nesta firma havia rodízio de turno e quando ele tinha folga consertava panelas para reforçar o orçamento.

         Casou-se com Leonice Arruda da Silva e tiveram três filhos: Marcelo, Marcos e Michele. E um neto, David, que é o xodó do vovô-coruja. Diz, rindo, que “com a bunda sentada no chão”, conseguiu pagar a Faculdade de dois filhos que se formaram em Administração de Empresas e estão bem empregados. O terceiro filho é vendedor de produtos alimentícios para supermercados.

Tem casa própria, carro e uma loja de utensílios domésticos em Ouro Fino, gerenciada pela sua esposa, onde vende muitos itens de cozinha, inclusive panelas de pressão de até 20 litros. Nos finais de semana a ajudo neste comércio.

Embora aposentado, não pretende descansar tão cedo, pois tem muita energia e vai continuar a fazer o que sempre gostou: trabalhar nestas cidades onde conquistou muitos amigos e clientes.

Ele diz que é um homem realizado na vida. 



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LAURINHA E EU
Romildo Labigalini

         Laurinha tem 4 anos e é sobrinha-neta da minha esposa Nilza e, logicamente, minha também. Mas por causa da minha idade – estou mais pra lá do que pra cá – e dos meus cabelos grisalhos, ela me chama de vô. Os pais dela Márcio de Almeida e Mara Ortega são sócios na malharia com minha esposa e residem temporariamente conosco, pois estão construindo casa própria que já está na fase final.
         Gosto demais da Laurinha, é muito inteligente, linda, esperta e está estudando no “Prézinho Dona Ina”. Diz que é apaixonada pelo meu neto Gabriel que, segundo ela, é seu namorado. Tomara que este “namoro” dê certo e que daqui a uns vinte anos termine em casamento.
         Ela ainda não sabe ler e quando pega uma revista de historinhas infantis, senta ao meu lado e me pede para lê-la. Às vezes acrescento alguma coisa que não está na revista, ela me manda parar, diz que não é assim e explica como realmente é, e eu me divirto com isso. Quando abraço ou beijo minha esposa, Laurinha não gosta, sente ciúmes da tia e tenta nos separar.
         O que ela gosta mesmo – e eu também – é brincar de mamãe e filhinho comigo. Lógico que eu sou o seu filhinho. Um dia cheguei do trabalho para almoçar, fui ao banheiro lavar as mãos e Laurinha estava lá escovando os dentes. Tinha apertado tanto o tubo do creme dental que esparramou dentro da pia. Quando me viu disse:
 - Filho, olha a cagada que a mamãe fez, mas pode deixar que eu vou limpar tudo isso!
Daí a pouco ela veio até mim e perguntou:
 - Filho, você já fez a tarefa da escola?
Digo que sim e ela quer se certificar. Como ainda não sabe ler pego qualquer escrito no meu escritório e mostro a ela, que fica satisfeita. Já sabe manusear os controles da TV, DVD e também do aparelho celular, como tirar fotos, ligar o rádio e fazer ligações.
         De vez em quando quer brincar de cachorrinho comigo. Pega um cordão, coloca no meu pescoço e diz:
 - Lulú, deita no chão, fica de costas e balança as perninhas!
E o tonto aqui obedece. Quando estava me puxando da sala para a cozinha, levantei uma perna e fiz de conta que o Lulú ia fazer xixi na parede. Ela dava tanta gargalhada que eu tive que repetir este gesto umas dez vezes.
         Ontem na hora do jantar, embora seus pais e a tia Nilza estivessem à mesa, ela quis sentar-se em meu colo e comer junto comigo no mesmo prato. Quando terminou, pediu-me que a levasse no colo até a sala para assistir TV, pois estava “com a barriga cansada”. Todas as noites na hora em que vou me deitar, chego até ela e digo:
 - Boa noite, mamãe!
 - Boa noite, filho.
 - Durma com Deus mamãe!
 - Você também filho. CABEÇA DE PUDIM!
         Não sei o significado, mas acho graça na carinha linda e alegre dela. Ser abençoado por uma criança é algo maravilhoso.
         Quando sua família se mudar para a nova casa, vou sentir muita falta da minha querida Laurinha. Todas as noites irei vê-la, brincar um pouco e na despedida vou lhe dizer:


 - Boa noite, mamãe!



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O Pequeno GRANDE HOMEM
                                              Romildo Labigalini - 1993
     Aqui em Monte Sião todos o conhecem pelo apelido de “Pechinha”, mas seu nome verdadeiro é Lupércio de Souza. É casado com Geralda Borges de Souza e tem 11 filhos, uma “gentaiada que dorme uns sobre os outros” ele diz.
   Começou como servente de pedreiro na Porcelana de Monte Sião, passando a trabalhar no forno da mesma até o ano passado, pois está com a saúde precária (pressão alta e problemas cardíacos) e está providenciando sua aposentadoria.
   É uma pessoa alegre, extrovertida, comunicativa, popular, muito inteligente e suas respostas estão sempre na ponta da língua afiada.
   Quando mocinho, era peão e gostava muito de rodeio, geralmente organizado pelo Rico Segundo num campinho de futebol. Vestia-se de gaúcho, calça bombacha, botas, camisa de cetim amarela, chapéu de 4 bicos e uma faixa vermelha na cintura. Ficava chique. Toureava, batia capa e montava no boi e nessa época ainda não bebia.
   Certo dia apareceu por aqui um toureiro chamado Zeca Pintado, que o levou a participar de rodeios em muitas cidades. Era uma atração. Confidenciou-me nostálgico:
   “Eu era tão ágil e hoje não consigo nem subir numa cadeira”.
   Gostava muito de dançar, principalmente na casa do Zé do Campo. Diz ele rindo:
   “Quando a sanfona abria o fole, eu já ficava com os olhos acesos nas mulheres”. No meio do baile vinha o Aurélio da Cota com uma rosa na mão para ser leiloada e quem desse o maior lance tinha o privilégio de ser o primeiro a escolher a dama para dançar. Mesmo com pouca grana Pechinha dava um jeito de arrematar a flor.
   Era um artista nato: na década de 60 atuou na Rádio Difusora de Monte Sião, fazendo sátiras, humorismo e contando piadas. Montou até um cirquinho, auxiliado pelos filhos do Joaquim Soldado, onde hipnotizava a criançada. Fez um caixão de defunto e fazia o papel de vampiro, com uma dentadura saliente e dois dentes de ouro. Colocava embaixo da camisa uma bexiga com sangue de porco e quando simulava uma facada no peito, o sangue jorrava e muitos saiam correndo, pensando que era verdade.
   Para fazer a propaganda do cirquinho saía pelas ruas montado em um burrinho, usando uma cabaça como microfone.
   Quando começou a namorar sua esposa, ela tinha 13 anos de idade e ficaram logo apaixonados. Certo dia estava jogando sinuca num bar e tomou uma súbita decisão: emprestou a bicicleta do Paulinho Babão, colocou a namorada na garupa e foram até a casa dos pais dela que residiam no Bairro Furrier, para pedir autorização para ela ir morar com ele, e os pais consentiram.
   Pechinha, sempre brincalhão disse do futuro sogro:
   “Vou acabar de criar sua filha e depois caso com ela”.
   Quando ela completou 16 anos, já tinham um filho e se casaram.
   Num sábado, estando nervoso pela perda da mãe e de uma filha, a situação financeira difícil, começou a beber, sentiu-se angustiado, desatou a chorar e resolveu suicidar-se num pé de abacateiro no quintal. Foi ate ao rancho, pegou um laço, amarrou-o num galho, colocou-o no pescoço e saltou. Foi caindo batendo nos galhos e espatifou no chão. O laço era muito comprido e ele quebrou duas costelas. Não foi desta vez.
¨¨¨¨¨
   Um dia Pechinha viu na TV uma pessoa saltando de paraquedas e disse a si mesmo que também poderia voar. Foi ate a loja do Plácido, comprou um guarda-chuvas e reforçou as varetas para ter maior segurança. Ventava forte, subiu em cima do telhado e pulou. O vento o levantou 3 metros e depois ele ”virou chapéu velho, arregaçando tudo”, caindo num canteiro de alho e não se feriu.
¨¨¨¨¨
   Comprou uma arma “Beretta” de 17 tiros. Chegou em casa à noite, “beudo” e já deu um tiro na lâmpada de fora. “Hoje é meu dia, desta vez eu suicido mesmo”. Apontou a arma no ouvido e puxou o gatilho cinco vezes e nada. Colocou-a na boca, puxou novamente e nada, falhou novamente. Raivoso, colocou a arma no chão e fez cocô em cima dela, catou cinza e jogou em cima. No dia seguinte, mais calmo, pegou a arma, limpou-a e foi testá-la numa tábua e funcionou. Vendeu-a e prometeu que nunca mais tentaria suicídio.
¨¨¨¨¨
   Perguntei se ele tinha 1,50 de estatura e me respondeu, brincando:
 - Um metro e meio não é altura de homem, eu tenho 1,55.
   Na sua mocidade foi meia-esquerda do time de futebol KALÚ E.C. Diz ele que era tão bom jogador, que quando batia escanteio, era tão veloz que chegava primeiro que a bola, marcando gol de cabeça.
   Fui até sua residência dar um dedo de prosa e tomar um gostoso cafezinho. A casa, embora simples é alegre e aconchegante. Seu filho Adriano pegou o violão e os outros filhos Juscelino, Márcia e Regiane formaram um pequeno coral. A cantoria estava tão bonita que deixou o papai-coruja orgulhoso e, emocionado, me confidenciou:
 - Estou realizado na vida, pois meus filhos são abençoados por Deus e por mim.
   Ouvindo as belas melodias, cavalgo no tempo. Percorro os olhos pelas paredes, observando os quadros pendurados, um relógio, um lindo Cristo de olhos azuis e detenho-me na frase de um quadro que se adapta muito bem ao Pechinha e sua família:


   “ENCHA O CORAÇÃO DE AMOR”.  
                




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O SOBRADO CENTENÁRIO
Romildo Labegalini
         Passando pela Rua Tancredo Neves, nº 400, notei na pequena sacada do sobrado a data da sua construção: 1.894. E também as iniciais F.T..
Este prédio antigo, um dos últimos da cidade está bem conservado, embora erguido há 119 anos. O proprietário era o senhor Francisco Toni, imigrante italiano e rico fazendeiro aqui em Monte Sião. Felício Lazzarini e Modesto Volpini - também italianos - foram os construtores deste prédio.
         Naquela época esta rua, a principal da cidade, chamava-se Rua Direita. Posteriormente Rua XV de Novembro e agora Presidente Tancredo Neves. Lembro-me nesta rua quando ainda era descalça, de terra batida e com os postes de luz alinhados no centro dela. Ao escurecer vinha o senhor Dito da Usina, com um comprido bambu e ligava as chaves dos postes, acendendo as lâmpadas. De manhãzinha retornava apagando-as.
         A energia elétrica era gerada onde se localiza hoje a Vila São Simão. (o antigo lago desta usina foi aterrado para se fazer este loteamento). Os proprietários desta mini-usina eram os senhores Ramalho e Zuccon. Hoje, desta hidrelétrica só restam as comportas e a pequena cachoeira com suas águas poluídas e fétidas.
         Mas o assunto não é este, é o sobrado que o Sr. Caetano Gotardello comprou posteriormente e o alugou ao seu neto Antônio Gotardello Sobrinho (Tônico). O avô ensinou ao neto a profissão de padeiro, que logo botou a mão na massa e surgiram os deliciosos pães carioca e francês, torradinhas, bolachas, queijadinhas, brevidades, bom-bocados, quindins, crepes, suspiros, pudins e outras delícias.
         Enquanto a massa do pão crescia, Tonico fazia o que mais gostava: prendia o avental branco na cintura, pegava o seu inseparável trombone e executava, com suavidade, as mais lindas melodias, inclusive algumas de sua autoria. Até a massa crescia mais. Durante muitos anos existiu em Monte Sião um conjunto musical que abrilhantava os bailes no clube local e em outras cidades. Chamava-se “Jacob e Seu Ritmo” e seus componentes eram: Jacob Penacchi (bateria), Tonico Gotardello (trombone), Horácio Penacchi (pistão), Jair Zucato (saxofone), Pascoal Andreta (clarinete e saxofone), Adolfinho Mantovani (saxofone), Geraldo Mariano Silva (acordeão), Elpidio Glória (clarinete), Linde Gotardello (pistão), Ramiro Guirelli (pandeiro) e Aurélio Penacchi (banjo).
         Tonico também participava de um grupo de serestas e de uma Banda de Música. Em 1972 ele faleceu. Sua filha Wanda e o genro Mário Labegalini, que residiam em São Paulo resolveram mudar-se para cá e continuar com a padaria. Este casal era leigo nesta nova profissão, mas o irmão de Wanda, Waldemar, ensinou pacientemente a arte de padeiro.
         Nesta época o proprietário do sobrado era o Sr. João Gotardello, que resolveu vendê-lo dando preferência a Mário e Wanda. Estes emprestaram o dinheiro e adquiriram o prédio. Meses depois Mário acertou na Loteria Esportiva, saldou a divida e fez uma reforma na propriedade. Quando seus amigos souberam que ele foi o sortudo, foram todos na padaria para comemorar. O saudoso Miltão de Castro, grande amigo de Mário e muito brincalhão, entrou para dentro do balcão e distribuía gratuitamente, todos os doces que havia na vitrine. No dia seguinte aconteceu a mesma coisa e ele iria “aprontar” muito mais. Mário levantava às quatro da manhã para preparar os pães e doces e após o almoço tirava um cochilo para descansar. Miltão aproveitava este momento, entrava na padaria e colocava passarinhos dentro dos vidros de balas. Outras vezes estacionava seu carro bem em frente ao quarto onde Mário dormia e ficava buzinando longamente até acordá-lo. Quando Miltão ia comprar pães e doces, pagava com uma grande quantidade de moedinhas de pequeno valor, só para ver seu amigo ficar bravo, mas Mário gostava dessas brincadeiras.
         Certa vez Mário foi ator de televisão. A TV Bandeirantes estava filmando a novela “Os Imigrantes” e em vários capítulos a cena se passava dentro de uma padaria antiga. A equipe veio para Monte Sião e deu um “trato” na padaria dele para deixá-la mais velha. Colocaram um espelhinho na parede e um colchão no chão, onde o ator-padeiro dormia. Nas cenas de choro os atores usavam cebola cortada para lacrimejar os olhos. Mário entrou em cena com embornal à tiracolo, dirigiu-se ao padeiro português e comprou alguns pães. A filmagem durou dois dias e todas as cenas referentes à padaria foram feitas aqui.
         Mário aposentou-se em 1986 e faleceu em 1988. Hoje não mais existe o famoso forno da padaria. Na frente da parte térrea funciona uma bonita loja de chocolates “Cacau Show”. Wanda ainda mora no sobrado, sozinha. Sua simpatia, a risada gostosa e sempre alegre é uma companhia muito agradável e de alto astral.
         O seu quarto fica na parte superior do sobrado e à noite, ao deitar-se, faz sua costumeira oração. O sono vem chegando e ela parece ouvir da imaginária padaria o som de uma música suave do trombone do seu pai.

          - Boa noite dona Wanda! Durma bem! 



***


CONSELHOS
Colaboração de João Martins

Não diga tudo que sabe
Não faça tudo que pode
Não acredite em tudo que ouve
Não gaste tudo o que tem
           PORQUE
Quem diz tudo o que sabe
Quem tudo o que pode
Quem acredita em tudo que ouve
E quem gosta tudo o que tem,
         MUITAS VEZES
Diz o que não convém
Faz o que não pode
Julga o que não vê
E gasta o que não pode.

Quem compra sem poder
Vende sem querer.

Primeiro ganhar
Pra depois gastar.



                   
***


QUANDO ME TORNEI INVISÍVEL
Romildo Labigalini
(Este texto não é de minha autoria. Quem me mandou este email foi meus amigos David e Silvia, de São Paulo a quem muito agradeço).
Já não sei em que data estamos. Lá em casa não há calendários e na minha memória as datas estão todas misturadas. Me recordo daquelas folhinhas grandes, uns primores, ilustradas com imagens dos santos que colocávamos no lado da penteadeira. Já não há nada disso. Todas as coisas antigas foram desaparecendo. E sem que ninguém desse conta, eu me fui apagando também.... Primeiro me trocaram de quarto, pois a família cresceu. Depois me passaram para outro menor ainda com a companhia de minhas bisnetas.
Agora ocupo um desvão, que está no pátio de trás. Prometeram trocar o vidro quebrado da janela, porém se esqueceram, e todas as noites por ali circula um ar gelado que aumenta minhas dores reumáticas. Mas tudo bem... Desde há muito tempo tinha intenção de escrever, porém passava semanas procurando um lápis. E quando o encontrava, eu mesma voltava a esquecer onde o tinha posto. Na minha idade as coisas se perdem facilmente: claro, não é uma enfermidade delas, das coisas, porque estou segura de tê-las, porém sempre desaparecem.
Noutra tarde dei-me conta que minha voz também tinha desaparecido. Quando eu falo com meus netos ou com meus filhos não me respondem. Todos falam sem me olhar, como se eu não estivesse com eles, escutando atenta o que dizem. As vezes intervenho na conversação, segura de que o que vou lhes dizer não ocorrera a nenhum deles, e de que lhes vai ser de grande utilidade. Porém não me ouvem, não me olham, não me respondem. Então cheia de tristeza me retiro para meu quarto e vou beber minha xícara de café. E faço assim, de propósito, para que compreendam que estou aborrecida, para que se dêem conta que me entristecem e venham buscar-me e me peçam perdão …Porém ninguém vem.... Quando meu genro ficou doente, pensei ter a oportunidade de ser-lhe útil, lhe levei um chá especial que eu mesma preparei. Coloquei-o na mesinha e me sentei a esperar que o tomasse, só que ele estava vendo televisão e nem um só movimento me indicou que se dera conta da minha presença. O chá pouco a pouco foi esfriando……e junto com ele, meu coração...
Então noutro dia lhes disse que quando eu morresse todos iriam se arrepender. Meu neto menor disse: “Ainda estás viva vovó? “ Eles acharam tanta graça, que não pararam de rir. Três dias estive chorando no meu quarto, até que numa manhã entrou um dos rapazes para retirar umas rodas velhas e nem o bom dia me deu. Foi então quando me convenci de que sou invisível...Parei no meio da sala para ver, se me tornando um estorvo me olhavam. Porém minha filha seguiu varrendo sem me tocar, os meninos correram em minha volta, de um lado para o outro, sem tropeçar em mim.
Um dia se agitaram os meninos, e me vieram dizer que no dia seguinte nós iríamos todos passar um dia no campo. Fiquei muito contente. Fazia tanto tempo que não saía e mais ainda ia ao campo! No sábado fui a primeira a levantar-me. Quis arrumar as coisas com calma. Nós os velhos tardamos muito em fazer qualquer coisa, assim que adiantei meu tempo para não atrazá-los. Rápido entravam e saíam da casa correndo e levavam as bolsas e brinquedos para o carro. Eu já estava pronta e muito alegre, permaneci no saguão a esperá-los. Quando me dei conta eles já tinham partido e o carro desapareceu envolto em algazarra, compreendi que eu não estava convidada, talvez porque não coubesse no carro, Ou porque meus passos tão lentos impediriam que todos os demais caminhassem a seu gosto pelo bosque. Senti claro como meu coração se encolheu e a minha face ficou tremendo como quando a gente tem que engolir a vontade de chorar. Eu os entendo, eles vivem o mundo deles. Riem, gritam, sonham, choram, se abraçam, se beijam. E eu, já nem sinto mais o gosto de um beijo.
Antes beijava os pequeninos, era um prazer enorme tê-los em meus braços, como se fossem meus. Sentia sua pele tenrinha e sua respiração doce bem perto de mim. A vida nova me produzia um alento e até me dava vontade de cantar canções que nunca acreditara me lembrar. Porém um dia minha neta Laura, que acabava de ter um bebê disse que não era bom que os anciãos beijassem aos bebês, por questões de saúde...
Desde então já não me aproximo deles, não quero lhes passar algo mal por minhas imprudências. Tenho tanto medo de contagiá-los ! Eu os bendigo a todos e lhes perdôo, porque...

‘QUE CULPA EU TENHO DE TER ME TORNADO INVISÍVEL?’



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SETEMBRO CHEGOU
Romildo Labigalini

Seis horas da tarde fecho minha imobiliária e vou direto para casa. Hoje passei um dia muito gostoso, pois ontem foi meu aniversário. Cheguei à conclusão de que sou muito querido e tenho amigos verdadeiros, pois recebi tantos emails e telefonemas que fiquei até emocionado.
Como é nosso costume, não convidei ninguém para a comemoração, pois sabia que meus familiares viriam participar comigo a alegria de mais um ano de vida. E vieram!
Entre comes e bebes, conversas, recordações, passagens alegres, todos apertadinhos em volta da mesa, bem juntinhos como gostamos de ficar, tornou o clima ainda mais aconchegante. Minha esposa Nilza preparou tudo com muito carinho. É por isso que meus filhos e netos a adoram, pois está sempre alegre e comunicativa. Sua companhia me agrada, gostamos de conversar tomando uma cervejinha e saboreando um tira-gosto. Hoje começamos a enumerar os aniversariantes do mês de setembro dos nossos parentes de que temos conhecimento. São dezesseis:  
Meus filhos Mônica, Meire e Marcelo e também o meu, minha nora Ivanir, meus irmãos Ronaldo e Irene, minhas cunhadas Maria Aparecida (Tidinha) e Vânia, minha sobrinha Clara, meus primos Irineu e sua esposa Maria Aparecida, residentes em Londrina-PR, Aline (Marumbi-PR), Édna (Apucarana-PR), Maria de Lourdes (Maringá-PR) e Leonides, também em Maringá. Como é bom ter bastante parentes. É muita festa e alegria.
         Por isso adoro o mês de setembro, início da primavera, pois até a natureza fica mais linda, as flores se abrindo, desabrochando, multicoloridas, enfeitando tudo à nossa volta. O clima é ameno, o frio já terminou, tudo é maravilhoso.

         Desejo a todos os aniversariantes de setembro, muita paz, alegria e vida longa. Parabéns! 



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MEU PRESENTE DE NATAL
Romildo Labigalini
         Quando eu tinha 13 anos, minha mãe faleceu no dia 20 de novembro. Foi muito penoso pra mim. No mês seguinte, dezembro, as músicas natalinas ecoavam pela cidade e eu ficava triste ao ouvi-las, recordando com saudades de minha mãe. Também eu pensava nas criancinhas pobres que talvez não ganhariam nem um simples presentinho de Papai Noel.
         O tempo foi-se passando, mas minha tristeza de fim de ano me acompanha até hoje. Em dezembro passado minha esposa Nilza, sempre preocupada comigo nesta época natalina, sugeriu-me em viajarmos a outro lugar para, assim, amenizar minha tristeza. Gostei de sua sugestão e perguntei onde ela gostava de ir. De imediato respondeu-me que preferia ir ao Paraná, em Marumbi e kaloré, onde temos parentes queridos e também já fazia oito anos que não nos víamos.
         No dia seguinte, por feliz coincidência, meu filho Márcio, que reside em Campinas, me ligou convidando-me em passar o Fim de Ano no Paraná. Combinamos a viagem. Minha esposa ligou para nossa prima Janice Labegalini, casada com Euclides De Nez, residentes em Marumbi. Ele atendeu, ficou muito contente e disse para ficarmos em sua casa.
         Minha esposa lhe disse que gostaríamos de ficar em sua fazenda no bairro dos Patos, desfrutando da natureza, pertinho da cidade e próximo ao bairro onde ela nasceu, no Guaraci.
Dias depois Janice nos ligou dizendo que havia convidado nosso primo Sérgio Luiz Labegalini, de Marília-SP e que ele havia confirmado que viria. (Nós havíamos conhecido Sérgio no “Encontro da Família Labegalini” na cidade de Parapuã, em 2012).
         No dia 23 de dezembro, nós, aqui de Monte Sião partimos para lá: eu, Nilza, sua sobrinha Mara com o marido Márcio de Almeida e Laurinha, de 5 anos, filha deles. Laurinha me chama de “Vô” e sua companhia é sempre alegre. Meu filho Márcio e sua esposa Ivanir chegaram dia 24 e ficaram hospedados na “Fazenda Santa Rita”, em Kaloré, de propriedade dos primos Tidinho e Marilene. O primo Irineu Labegalini, residente em Londrina e a prima Elisa Labegalini, de Jaraguá do Sul - Santa Catarina, também vieram compartilhar conosco. (Elisa nasceu no bairro Labegalini, aqui nas Minas Gerais e era a moça mais linda do bairro. Hoje, aos 80 anos continua bonita).
         No dia 28 de dezembro, para completar nossa alegria, chegou o primo Sérgio, com sua simpática esposa Andréia e os filhos Leonardo, Henrique e Gabriel, e também ficaram hospedados na fazenda do Tidinho.
         Com a chegada do Sérgio o ambiente ficou ainda mais alegre. Ele, além de cantar e tocar violão, adaptou uma gaita em sua boca. Foi um sucesso e todos os dias havia cantoria. Até os irmãos Benjamim e Sebastião Labegalini, com mais de 80 anos também cantaram e muito bem.
         Meu primo Rubinho Labegalini e sua esposa Adriana convidaram a turma toda para jantar em sua casa. Tive a grata surpresa de encontrar-me com minha prima Simone Travagin Labegalini, jornalista responsável pelo jornal “Monte Sião” e seu marido Antônio de Paula, também jornalista e escritor, residentes em Maringá-PR. Depois do jantar a cantoria foi até a madrugada.
         No último dia do ano, 31, foi aniversário da prima Janice, e mais uma festa.
Uma agradável e bem-vinda chuva veio saudar o início do Ano Novo e saciar a sede das lavouras de soja.
         Só me resta agradecer a todos pela carinhosa acolhida, em especial aos casais Euclides e Janice, Tidinho e Marilene e seus familiares.
         Vocês nos deram um grande presente.

         Vocês foram o nosso Papai Noel.



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O TITANIC



Romildo Labegalini
            Meu irmão Tadeu Labegalini tem uma chácara muito aconchegante no bairro Mococa, onde mora. Lá é o ponto de encontro de todos nós, seus familiares. O fogão de lenha aceso defumando linguiça pura que ele mesmo faz, fritando um torresminho também preparado por ele, uma cerveja geladinha e um gole de cachaça, completa a gostosura e aí a conversa vai longe.
            Ele já foi professor, criador de cabras, fazedor de queijos, vereador por 4 mandatos, comerciante, malharista e agora é corretor de imóveis, meu “concorrente”. Em seu “latifúndio”, uma restinga de mata, um bananal para alimentar os passarinhos e 2 pequenos lagos onde cria tilápias para nosso consumo, embelezam a propriedade.
            Tadeu é casado com Orlei Nascimento e o casal tem três filhos: Henrique, André e Guilherme. Henrique é casado com Fânia Carvalho e tem uma linda filha que se chama Bianca, com três anos e meio de idade, que adora os avós. Quando Bianca tinha 2 anos, a avô “Lei” como ela a chama, construiu um pequeno parquinho, com piscininha e uma casinha cor-de-rosa com floreiras nas janelas. Ficou uma maravilha.
            Numa plaquinha pendurada na parede da cozinha está escrito: “Na casa da vovó tudo pode”. Realmente é lá onde Bianca gosta de ficar e passar o fim de semana brincando no parquinho, com os cachorros, cavalos e galinhas.
            Tadeu, para agradar a neta, resolveu construir um barquinho para navegarem no “imenso” lago. Serrou 4 tábuas, colocou garrafas pets vazias embaixo e fixou uma tela para unir essas garrafas. Na parte de cima colocou canos de PVC para proteção das laterais. Não ficou com aparência de um barquinho, mas sim, de uma balsa, que recebeu o nome de “Titanic”. Ele amarrou uma corda na ponta do “barco” e fincou 2 paus nas extremidades do lago. Quando puxava a corda a balsa movia em linha reta. Nela só cabia o Tadeu e Bianca, que ficava sorrindo de tanta felicidade.
            Dia desses ele resolveu inovar a embarcação. Fez um remo e navega o lago todo. Esse “Titanic”, com certeza não vai naufragar, pois aqui não há icebergs.

            Como todos dizem, neta é filha duas vezes. Então o amor do avô também é duplo e os dois se completam.


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O FORNO DE BARRO


Romildo Labegalini
Meu irmão Tadeu (aquele que mora em sua chácara no bairro da Mococa e que fez uma pequena balsa de garrafas pet, batizada com o nome de “Titanic” para agradar sua netinha Bianca), já construiu em sua propriedade um fogão à lenha e uma churrasqueira. É lá que eu gosto de ir todo fim de semana para tomar “umas”, conversar e comer aquela linguiça que ele mesmo fabrica.
Agora ele resolveu fazer um forno de barro para assar leitoa, pão caseiro e tudo o que for “assável”. Meu filho Márcio e sua esposa Ivanir que residem em Campinas e têm uma pizzaria em Barão Geraldo se ofereceram para estrear este forno com pizza. Todos aplaudiram essa ideia. Com receio de que não desse certo, meu filho quis fazer um teste, uma pré-estreia, que foi feita na sexta-feira passada, com poucas pessoas (eu não podia faltar). Trouxeram lenha própria de sua pizzaria, acenderam o forno, minha nora Ivanir e meu filho Márcio começaram a abrir a massa. A primeira que saiu foi de aliche e todos provaram e aprovaram o forno e os pizzaiolos.
Na noite seguinte, sábado, foi a estréia oficial e triunfal: as mesas foram enfeitadas com toalhas da cor da bandeira da Itália: verde, vermelho e branco. Minha irmã Doraci e suas filhas Júlia Ângela e Ritinha, residentes em Jundiaí, vieram também, trazendo muita alegria para todos nós, pelas suas agradáveis companhias. Começamos a tomar vinho e brindar aquele momento tão especial. As mesas ficaram lotadas, o Márcio e a Ivanir firmes na massa e no forno e as deliciosas pizzas sendo servidas. Consumimos vinte e duas.
Com todo esse sucesso, o Márcio e a Ivanir “faturaram alto”. Foi uma noite maravilhosa. No dia seguinte, domingo, regressamos à casa do Tadeu para o almoço e o encerramento da “comilança”. Desta vez foi frango caipira, polenta, almeirão e macarrão. Uma delícia. É por isso que estou ficando barrigudo.